Connect with us

Negócios

Mundo vai entrar em nova era de investimentos (mas o Brasil não), diz J.P. Morgan

Prublicadas

sobre

gabriela santos JP morgan
Tempo de Leitura:9 Minuto, 35 Segundo


Com o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) encaminhando o início do afrouxamento da política monetária, o mundo começa a vislumbrar um novo momento econômico e de investimentos. Se, por um lado, a renda fixa deve continuar interessante nos mercados globais, haverá atratividade da renda variável.

Mas esse novo cenário ainda será marcado por incertezas e volatilidade, exigindo cautela dos investidores, diz Gabriela Santos, estrategista-chefe para Américas do J.P. Morgan Asset Management, que detém US$ 3,3 trilhões em ativos sob gestão globalmente.

“Claramente é uma nova era, não é mais aquela era de juros zero, super previsível, mar calmo”, afirma ela em entrevista ao NeoFeed. “É bom ter um custo do dinheiro, ter juros reais positivos, alocação de capital apropriada. Mas isso quer dizer que nem toda companhia, nem todo ativo, irá bem.”

No começo dessa nova era, os Estados Unidos seguem como o principal mercado global, mas o Japão volta ao radar após 30 anos. Entre os emergentes, Santos destaca as boas perspectivas daqueles ligados aos temas de inteligência artificial e semicondutores, boa parte deles na Ásia, além da Índia, dadas as perspectivas de crescimento.

Já o Brasil segue em segundo plano, sendo um mercado para quem conhece as companhias locais e consegue identificar as boas oportunidades (que existem). Porém, na renda fixa, a volta de juros reais nos Estados Unidos diminuiu o interesse por títulos locais.

“Agora está um pouco mais complicado, especialmente com um pouco mais de atratividade da renda fixa americana e mais volatilidade em termos de moedas”, diz Santos.

O início desta nova era vem com a perspectiva de cortes de juros nos Estados Unidos. A grande questão é em qual ritmo a queda se dará, além das dúvidas sobre qual é a taxa neutra dos Estados Unidos, algo que o mercado espera uma resposta já na sexta-feira, 23 de agosto, quando o presidente do Fed, Jerome Powell, fará um discurso no tradicional simpósio de Jackson Hole.

Até que o afrouxamento comece a acontecer, Santos entende que os mercados seguirão turbulentos. “Vamos continuar com essa volatilidade elevada dos juros americanos até realmente termos o primeiro corte, entender melhor o ritmo [dos cortes] e a visão deles do [ponto] neutro”, diz.

Acompanhe, abaixo, os principais trechos da entrevista:

O que explica a recente volatilidade nos mercados globais?
A volatilidade que vimos no fim de julho e começo de agosto teve uma grande dose de fatores técnicos. Muitos investidores, do mundo todo, estavam basicamente investidos da mesma maneira. E aí, quando teve uma pequena mudança no lado dos fundamentos, essas posições são removidas ou mudadas, e isso amplifica o movimento. Mas movimentos técnicos tendem a ser breve, e esse foi. Depois de cair quase 9%, as ações americanas estão a menos de 1% das máximas históricas. Para nós, a visão do mundo, o contexto para o investidor de longo prazo, não mudou muito nas últimas semanas.

Na parte de fundamentos, especialmente dos Estados Unidos, que foi o gatilho para todo esse movimento, qual a situação da economia? O país está caminhando para um soft landing?
Os Estados Unidos estão em um soft landing. O país aumentou os juros no ritmo mais rápido desde os anos 1980, mas já faz um ano que os juros não sobem e nesse período a economia tem estado bem resiliente. Estamos vendo uma normalização do ritmo de crescimento, mas ele ainda é bem bom, perto de 2%, que é a média dos Estados Unidos de longo prazo. Agora, a discussão é por quanto tempo esse soft landing continua antes de uma inevitável recessão, que acontece de vez em quando.

O que isso significa para o Fed?
Da perspectiva Fed, a principal informação foi dada na reunião de 31 de julho, quando Powell disse que o panorama é de um crescimento bom, a inflação voltando ao normal e que vê o mandato do Fed equilibrado entre o lado da inflação e o lado do crescimento, abrindo caminho para normalizar os juros, e manter o soft landing pelo máximo de tempo possível. Está claríssimo que os juros vão começar a cair na reunião de setembro. O que precisa definir é o ritmo dessa jornada da volta a juros mais normais.

A projeção do J.P. Morgan Asset é de dois cortes neste ano?
Essa era a nossa visão anterior, quando o Fed ainda parecia muito preocupado com a inflação. Depois da reunião de julho, com essa visão mais equilibrada nos dois lados, e com a desaceleração do mercado de trabalho, temos que ter humildade [para fazer projeções]. Vai depender muito dos dados do mercado de trabalho de agosto para ver se o Fed vai querer começar devagar, com 25 pontos base, uma vez por trimestre, ou se vão preferir chegar um pouco mais rápido ao neutro. Vamos ver se o discurso do Powell, em Jackson Hole, dá alguma indicação do ritmo que preferem para voltar ao neutro.

Essa incerteza quanto ao ritmo de corte está baseada apenas na questão dos dados?
Ela está baseada em várias coisas. A década anterior foi de juros super baixos e eu acho que a questão para o mercado e o Fed é exatamente qual o neutro hoje em dia? Quão restritivos estão os juros e quão rápido pode cair para voltar ao neutro. Possivelmente o Powell comente um pouco disso amanhã [sexta-feira, 23 de agosto]. O segundo é qual a real eficácia da política monetária. Parece que a economia americana está menos sensível a mudanças no juros, e esse é o grande tema de Jackson Hole. Por fim é a posição cíclica da economia. O mercado de trabalho está normalizando ou é o começo de uma grande desaceleração?

“O que o Fed precisa definir é o ritmo dessa jornada da volta a juros mais normais”

Uma coisa que vimos é que a incerteza, as diferentes interpretações sobre os dados, tem gerado muita volatilidade nos mercados. Essa volatilidade dos mercados pode ser dissipada ou ainda conviveremos com essa situação?
Vamos continuar com essa volatilidade elevada dos juro americano até realmente termos o primeiro corte, entender melhor o ritmo [dos cortes] e a visão do Fed sobre a taxa neutra. Vamos ter que ver também os dados do mercado de trabalho, o que for dito no primeiro corte e as novas projeções do Fed. Quando a gente entender melhor, aí esperamos um pouco mais de normalização dos juros. Porém, claramente estamos numa nova era, não é mais aquela de juros zero, super previsível, mar calmo. A economia americana vai ter um pouco mais de inflação, juros mais normais e isso gera incerteza.

O que tudo isso significa para investimentos?
Isso não influencia nossa visão otimista em relação aos retornos nesse novo mundo. É bom ter um custo do dinheiro, ter juros reais positivos, alocação de capital apropriada. Mas isso quer dizer que nem toda companhia, nem todo ativo, irá bem. Mas, em geral, ainda é um mundo favorável em termos de renda fixa e ações globais.

Isso para países avançados, especialmente os Estados Unidos, ou os emergentes também vão se beneficiar?
Diria que em geral. Mesmo que o mercado americano seja o mais caro, ele ainda é, de longe, o maior mercado, de melhor qualidade em termos de lucro das companhias, estabilidade desse lucro, é o centro da inovação de inteligência artificial. Mas tem outros mercados também. No Japão, vemos a volatilidade técnica como oportunidade de adicionar exposição, porque a história de longo prazo, que ficou positiva, não mudou. Ela está relacionada às mudanças de governança corporativa, que devem injetar um novo dinamismo e rentabilidade num mercado que estava completamente esquecido por 30 anos.

E os emergentes?
A Ásia emergente tem boas oportunidades com o tema de IA, semicondutores, como Taiwan e Coreia do Sul. A Índia tem sua própria história idiossincrática positiva de longo prazo, que é 20% do índice emergente. Tem bastante coisa para fazer em termos de ações globais.

Como o Brasil se encaixa nesse cenário?
Pelo lado de ações, infelizmente, para o investidor global, emergentes em geral é um percentual pequeno da carteira de ações. E dentro de emergentes, o Brasil é um percentual muito pequeno. Das ações emergentes, 80% é Ásia. Com isso, é mais visto por aquele investidor que investe mais em emergentes especificamente, que olha mais na América Latina, no Brasil, buscando oportunidades específicas, que existem. Mas o Brasil tem boas empresas, boas oportunidades.

E no caso da renda fixa?
Em termos de renda fixa, já foi muito popular investir em renda fixa brasileira e mexicana em moeda local, por causa dos juros de dois dígitos e o diferencial de juros com os Estados Unidos. Isso manteve o real e o peso mexicano forte nos últimos dois anos. Agora está um pouco mais complicado, especialmente agora com um pouco mais de atratividade da renda fixa americana e mais volatilidade em termos de moedas.

“Mesmo que o mercado americano seja o mais caro, ele ainda é, de longe, o maior mercado e o de melhor qualidade”

A situação fiscal brasileira é um tema que preocupa os investidores globais? É uma situação que pesa nas decisões?
O tema é bem relevante pelo lado da renda fixa. Mas em termos globais tem muita discussão sobre as posições fiscais globais, não é só o Brasil que atrai atenção. Estamos vendo isso nos Estados Unidos. Um dos motivos que não vemos os juros de volta a zero nos Estados Unidos é que os juros mais longos precisam ter um prêmio de risco para absorver o déficit muito elevado do país. Isso não é problema para os Estados Unidos, porque é a moeda de reserva do mundo, mas indica que os juros de dez anos devem ficar ao redor de 4%.

Como é esse novo mundo que começa a surgir? E como ele afeta os investimentos?
Esse novo mundo é mais positivo, em que tem crescimento nominal. Terminou aquela era de não ter inflação em países desenvolvidos, crescimento muito baixo. Agora tem um pouco de inflação, não é um problema. E é também um mundo em que tem um potencial de um crescimento econômico real mais positivo por causa de toda essa disrupção tecnológica que estamos vivendo, que tem o potencial de aumentar a nossa produtividade.

O que isso significa para os investimentos?
Com isso vêm juros reais positivos e isso faz com que renda fixa global seja mais interessante. O lucro das companhias ainda pode ser melhor do que o da última década, então tem oportunidade em crédito corporativo e ações. Mas é um mundo que terá períodos de volatilidade por causa de um pouco mais de incerteza sobre inflação e juros e em que o investidor terá de tomar muito mais cuidado com a alocação do seu dinheiro. Não é mais o mundo em que todos surfam os juros a zero juntos e está tudo bem.

Qual tem sido a recomendação para os investidores?
Ainda preferimos, na margem, um pouco mais de ações do que renda fixa, nos Estados Unidos, Japão e Ásia emergente, especialmente Coreia do Sul, Taiwan e Índia. Ainda vemos oportunidades na China, mas, em termos marginais, outras áreas da Ásia emergente são mais interessantes. Na renda fixa, nossa mensagem principal é aumentar o duration, com prazo de cinco e seis anos, pelo custo de oportunidade. No curto prazo, daqui a 18 meses, não vai estar mais 5,4%, então o momento de capturar oportunidades é agora. E gostamos bastante de crédito corporativo, especialmente americano.





Fonte: Neofeed

Negócios

Mãos à obra: Bradesco Asset lança novo fundo de infraestrutura

Prublicadas

sobre

Mãos à obra: Bradesco Asset lança novo fundo de infraestrutura
Tempo de Leitura:3 Minuto, 44 Segundo


No 27 de setembro, a Bradesco Asset iniciará a listagem de mais um fundo de seu vasto portfólio. Desde o começo do mês de setembro, a gestora vem promovendo o tradicional road show de apresentação do produto, apontando as suas características, a estratégia de investimentos e o modelo de gestão, entre outros aspectos.

Logo de cara, é possível identificar benefícios trazidos pelo BINC11 – diversificação, liquidez, pagamentos mensais de dividendos e vantagens fiscais estão entre os mais visíveis.

O fundo foi desenhado para oferecer uma carteira diversificada de ativos de infraestrutura, especialmente aqueles voltados para setores como energia (geração e transmissão), saneamento, rodovias, terminais portuários e aeroportos, entre outros.

Os ativos selecionados estão tanto em fase pré-operacional quanto operacional, com perfil de caixa previsível e stakeholders com comprovado histórico de execução.

“Os fundos com ativos em infraestrutura vêm ganhando espaço nos últimos meses como resultado direto das mudanças de tributação de algumas classes de ativos”, afirma Fernando Pairol, Superintendente Comercial da Bradesco Asset.

As alterações regulatórias anunciadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) levaram os investidores a olhar com maior atenção para esses ativos.

O fundo foi desenhado para oferecer uma carteira diversificada de ativos de infraestrutura

Além disso, os projetos de infraestrutura estão em alta no Brasil, no embalo do desejo do governo federal em incentivar os investimentos na área como forma de gerar crescimento econômico.

O BINC11 está inserido nesse contexto, mas ele traz benefícios adicionais. “Trata-se de um produto democrático”, afirma Victor Tofolo, gestor de crédito privado da Bradesco Asset.

Voltado para investidores em geral, o novo fundo tem ticket inicial de R$ 100, o que certamente contribuirá para que desperte o interesse de um número elevado de investidores. Segundo a Bradesco Asset, a oferta poderá chegar a R$ 500 milhões, considerando o lote adicional.

No varejo, o BINC11 será distribuído pela Ágora, corretora do Banco Bradesco, mas a ideia é que os investidores possam acessar o produto por meio de outras plataformas.

O pagamento de dividendos mensais é outro atributo incontestável, assim como a isenção de Imposto de Renda sobre esses dividendos e também sobre potenciais ganhos de capital.

A liquidez é mais um benefício trazido pelo BINC11. Negociado no mercado secundário da bolsa de valores, ele contará com market maker. Seu objetivo de retorno líquido – já descontadas as taxas de administração e gestão – é o CDI mais o intervalo entre 0,50% a.a. e 1% a.a

Por si só, essas características fazem do BINC11 um dos ativos de investimentos em infraestrutura do país e o fato de contar com o suporte e a expertise da Bradesco Asset deve ser considerado pelos investidores.

Segundo a Bradesco Asset, a oferta poderá chegar a R$ 500 milhões, considerando o lote adicional

“O BINC11 se posiciona como um produto, trazendo um mix entre gestão ativa, que é muito forte dentro da Bradesco Asset, com uma análise profunda dos ativos através da curadoria da nossa mesa de crédito privado”, diz Pairol.

A gestão ativa é uma estratégia que tem sido bem-sucedida na gestora e um de seus diferenciais. A casa possui uma equipe especializada em análise e gestão de crédito setorial, com um histórico de atuação tanto no mercado primário quanto secundário.

Para se ter ideia, no ano passado, a Bradesco Asset negociou mais de R$ 22 bilhões no mercado secundário, acima dos R$ 15 bilhões transacionados em 2022. A expectativa é movimentar R$ 26 bilhões no segmento em 2024.

Tofolo reforça o trabalho da gestão ativa como um diferencial importante dos modelos da casa. “Tudo o que colocamos dentro de nossa carteira passa por rigorosa análise interna, com rating próprio, que ajuda a precificar corretamente os riscos de nosso portfólio”, diz.

A expertise da gestora vem de longa data. Em 2013, a Bradesco Asset foi uma das primeiras assets do país a lançar um fundo fechado de debêntures incentivadas, ativos que nos anos seguintes fizeram sucesso no mercado brasileiro.

E a casa está em permanente evolução. Recentemente, contratou dois profissionais para fortalecer o segmento. Um deles é especializado em project finance, enquanto o segundo tem experiência em produtos estruturados, dedicando-se principalmente às debêntures incentivadas.

Atualmente, a Bradesco Asset Management possui R$ 857 bilhões sob gestão (considerando carteiras administradas e FOF), sendo R$ 326 bilhões apenas na área de crédito. Números como esses a colocam entre as líderes do mercado brasileiro e evidenciam sua contribuição para o crescimento da indústria de asset management do país.



Fonte: Neofeed

Continue Lendo

Negócios

“Fusão com a Mobly é o abraço dos afogados”, diz fundador da Tok&Stok

Prublicadas

sobre

Regis Dubrule_TokStok
Tempo de Leitura:22 Minuto, 40 Segundo


Regis e Ghislaine Dubrule tinham o hábito de almoçar juntos todas as segundas-feiras na loja da Tok&Stok da marginal Pinheiros, em São Paulo. Ele, conselheiro, e ela, CEO, aproveitavam para circular pelo espaço e estreitar os planos para tentar recuperar a empresa de móveis e decoração fundada por eles em janeiro de 1978.

Mas essa rotina foi interrompida em 17 de julho quando o conselho de administração aprovou a destituição de Ghislaine Dubrule do comando da Tok&Stok. Votaram pela saída da CEO o chairman, Fernando Borges, que representa a controladora da empresa, a gestora SPX, e o conselheiro independente Roberto Szachnowicz.

A partir desse dia, a relação entre a família Dubrule e a SPX, que assumiu a operação de private equity do Carlyle no Brasil em 2021, entrou em rota de colisão. A implosão desse relacionamento ocorreu há um mês, em 9 de agosto, quando a Mobly e a SPX se acertaram para fusão com a Tok&Stok.

“A Mobly é uma empresa que, desde que ela existe, é um avião caindo. Nunca ganhou dinheiro”, diz Regis Drubrule, fundador da Tok&Stok, ao NeoFeed. “Somos contra o negócio porque a gente quer salvar a Tok&Stok, porque estamos convictos que conseguimos salvar com o aumento de capital, que é isso que foi a nossa divergência.”

A partir do anúncio da fusão com a Mobly, a família Dubrule, como acionista minoritária, entrou na Justiça para desfazer o negócio que o controlador vinha tentando há um ano. “Quando reunimos tudo, nessas três semanas, a Mobly estava ressuscitando. E a SPX disse: esquece o aumento de capital, vamos fazer a fusão”, afirma Dubrule.

Esse tudo a que o fundador da empresa de móveis e decoração se refere era um acordo com os bancos feito pela família para levantar R$ 100 milhões e fazer um aumento de capital na Tok&Stok, uma operação que Dubrule detalha o passo a passo nesta entrevista.

Ao conseguir a aprovação dos bancos, após anuência da SPX, segundo Dubrule, foi requisitada a assembleia para aprovação da capitalização. Ele e Szachnowicz aprovaram a proposta, mas a gestora não mandou representante.

A partir desse ponto, na visão da família Dubrule, começa uma série de irregularidades cometidas pela SPX. A assembleia para destituir o conselheiro independente, a convocação de outra para indicar um substituto e o não reconhecimento do aumento de capital. E, por fim, uma reunião extraordinária que indicaria emergência financeira.

Além dessa sequência, a família Dubrule questiona o fee de R$ 20 milhões pago aos bancos pela transação com a Mobly. “Ignorar o nosso aumento de capital foi uma irregularidade. Ignorar a questão do fee foi uma irregularidade. Não é normal ter um fee desse tamanho pago pela Mobly. Tem ainda recursos. Não estamos por cima no momento, mas estamos vivos.”

Em uma rara entrevista, Regis Dubrule conta ao NeoFeed se sente arrependimento de ter trazido um sócio-controlador, responde sobre cada um dos executivos que passaram pela companhia, fala o que pensa sobre a Mobly, a desgastada relação com Fernando Borges e a SPX e por que não abandona tudo e vai para a Riviera Francesa.

“O Fernando falou para mim em uma reunião: “não entendo por que vocês não vão para a Riviera Francesa e abandonam isso tudo?” Eu respondi: “porque eu não sou você”, conta Dubrule. “Ele não consegue imaginar que, para nós, não é a questão emocional, que existe. A gente acredita. É uma tristeza ver a empresa desaparecer.”

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:

A família Dubrule se arrepende de ter acertado a venda da Tok&Stok para o Carlyle em 2012?
Não gosto de dizer arrependimento, porque isso já faz 12 anos. Não dá para se arrepender de coisas tão antigas. E também porque tinha um plano, de venda e sucessão. Tenho cinco filhos e todo o nosso patrimônio estava na empresa. Eu já tinha passado dos 60 anos, não queria ter de repassar um negócio complicado, porque o varejo não é fácil, apesar do nosso sucesso. Passamos por diversas crises, planos econômicos, inflação, etc. Não é fácil. E nós dois [ele e Ghislaine] conseguimos passar. Repassar todo o patrimônio em uma empresa é difícil. A ideia era fazer um IPO, antes de vender. Seríamos diluídos, mas manteríamos a gestão, mesmo com participação minoritária.

A ideia do IPO foi antes da negociação com o Carlyle?
Isso. Aí tentamos vender para um fundo uma participação minoritária, em 2007. Fizemos um processo competitivo com o Rothschild, mas me desgostei porque estávamos bem avançados com um fundo brasileiro, muito bom, mas acontece que eles queriam a governança corporativa, apesar de serem minoritários. Eles colocaram tanta coisa que me senti amarrado e no fim achei perigoso, não valia. Depois aconteceu a crise e pensamos em vender o controle porque assim, pelo menos, venderíamos a governança a um valor maior. E vamos ajudar a fazer esse IPO que não conseguimos fazer, porque nenhum desses fundos quer entrar para ficar. Fizemos um processo competitivo com o BTG e o Carlyle não foi que ofereceu o maior valor.

“Ainda estamos contando que não vamos perder a empresa”

Então, por que a foi a gestora escolhida?
Porque eles gostavam da Tok&Stok, da cultura, de tudo o que eles não gostam mais e não respeitam. Mas no início respeitaram tanto que a Ghislaine se ofereceu para ser a CEO. Eles concordaram em ficar até dois anos e ela ficou quase cinco. E respeitaram absolutamente a companhia. Tínhamos divergência às vezes, mas nada relevante. Foi muito bem com o Carlyle. Havia um outro fundo, que estava com uma proposta nitidamente melhor, porém queria assumir no dia seguinte, que a gente saísse de uma vez. Não queríamos perder a empresa, era dividir com eles [investidores] e fazer o IPO, que acabou não acontecendo por tudo o que aconteceu nos anos seguintes. Mas lamentar? Eu vou lamentar mesmo se a gente não conseguir sair dessa situação inexplicável que estamos hoje. Ainda estamos contando que não vamos perder a empresa.

Por que a família Dubrule é contra a fusão com a Mobly?
A Mobly é uma empresa que, desde que ela existe, é um avião caindo. Nunca ganhou dinheiro. Conseguiram fazer um IPO brilhantemente, capturaram R$ 800 milhões há três anos e está sobrando R$ 150 milhões. Na última apresentação, conseguimos ver que no primeiro semestre deste ano queimaram R$ 70 milhões de caixa. Eles vão se espatifar mesmo. Com a Tok&Stok, eles querem se amarrar nas sinergias.

Os números são bem robustos.
Colocaram sinergias que vão entre R$ 70 milhões e R$ 130 milhões. Nós acreditamos em R$ 50 milhões. Mas vamos imaginar que o número deles está certo. Vamos pegar a média de R$ 100 milhões de captura. Eles estão queimando R$ 140 milhões de caixa por ano. Então, no melhor dos casos, vão parar de queimar caixa. E a Tok&Stok? Não é um avião que está embicado para baixo, é um avião que está muito fragilizado, mas o resultado está positivo. A Ghislaine estava chegando no resultado positivo. O mês de agosto deve ter sido excelente, julho já estava melhor.

“A Tok&Stok não é um avião que está embicado para baixo, é um avião que está muito fragilizado, mas o resultado está positivo”

No ano passado, a receita tinha sido de pouco mais de R$ 1 bilhão e o plano este ano era chegar a R$ 1,5 bilhão. Vai chegar?
Não vai chegar a R$ 1,5 bilhão, mas não vai ser muito longe disso. Mas o mais importante é o resultado. Porque no ano passado foi um prejuízo importante, mas neste ano vai ter um lucro miserável em relação à dívida. E um Ebitda entre R$ 10 milhões e R$ 20 milhões. Logicamente que, com a dívida que está, é insuportável. Mas, no curto prazo, passa. A dívida já foi reperfilada e em 2024 não tem nenhum vencimento. Inclusive vai terminar o ano com um caixa de R$ 100 milhões novamente.

Mas a fusão não faz sentido?
De um lado está a nossa empresa que tem o muro da dívida chegando e que está tentando endireitar as coisas, e os outros que vão vir na sinergia vão interferir em toda a operação. Por exemplo, no centro de distribuição de Extrema. Eles querem colocar tudo lá. Mas mexer em um centro de distribuição em um momento como estamos hoje é pior que uma mudança porque prejudica a operação. E não podemos nos permitir não faturar, já vimos esse filme no momento de mudar para lá. Tivemos de voltar para São Paulo porque não funcionava. Esse é um dos exemplos das sinergias que não funciona com duas empresas independentes. A nossa convicção é que eles precisam das sinergias, então não podiam demorar.

Mas e a fusão?
Podemos até imaginar um cenário. Deixa a Tok&Stok se consolidar e depois a fusão, um dia, para nós seria pensável se eles não tivessem essa queima de caixa e se nós tivermos em uma situação boa. Mas você pega duas empresas como estão… Somos contra o negócio porque a gente quer salvar a Tok&Stok, porque estamos convictos que conseguimos salvar com o aumento de capital, que é isso que foi a nossa divergência.

Qual foi a proposta da família que a SPX desconsidera?
Temos um aumento de capital na empresa, trazendo R$ 100 milhões, que dizemos que vamos trazer, e temos dívida na empresa que pode ser convertida em capital. Então é um aumento de capital de R$ 210 milhões. Fizemos uma reunião de conselho, que foi convocada conforme os estatutos da empresa, por dois conselheiros, eu e o independente, Roberto [Szachnowicz], e foi evidentemente apresentada ao Fernando Borges, da SPX, que não compareceu. Depois ele fez uma assembleia geral demitindo o Roberto, uma nova reunião do conselho apresentou um novo conselheiro e fez uma RE [reunião extraordinária] para conseguir fazer a fusão com Mobly, em uma sequência.

Quais são os erros nesse processo, na sua visão?
Primeira anomalia: ele desconsiderou a nossa reunião, que foi feita conforme os estatutos, está registrada na Junta Comercial e eles nem impugnaram. E, segundo, fizeram essa RE, que só pode ser feita em emergência, para consenso de pagamento. Fizeram a RE, mas não tem nenhuma emergência. A Tok&Stok está muito fragilizada, porque não tinha resultado, mas está melhorando, não queima mais caixa. O problema é o ano que vem e o seguinte, quando vai ter de pagar os vencimentos da dívida. Nós realmente achamos que temos de fazer um acordo com os bancos.

De que maneira seria esse acordo?
No nosso aumento de capital, pedimos 90 dias para apresentar aos bancos, porque em todo caso eles têm de concordar. Já tínhamos feito reuniões anteriores com os bancos há três meses. Para nós, a Tok&Stok é salvável. Montamos vários cenários de business plan e estamos confiantes que a gente consiga recuperar a empresa e daqui a três, quatro anos, quando vencerão todos os principais da dívida, a gente terá resultado suficiente para convencer investidores a colocar mais recursos na empresa ou até nós mesmos.

“Estamos dispostos a assumir o controle, mas não é o que queremos. Queremos salvar a empresa. E um acordo de acionistas para poder definir o CEO e manter as boas práticas para recuperar a empresa”

A família Dubrule quer recuperar o controle da Tok&Stok?
O Fernando sempre fala que nós fizemos isso porque queremos o controle. Mas não é. Propusemos o aumento de capital e queremos que eles participem. A gente quer salvar a empresa. E queremos que eles participem para dar mais recursos para a companhia garantir o futuro. Mas eles não quiseram. Porque eles têm um medo danado da Tok&Stok. Eles querem sair, desinvestir. Estamos dispostos a assumir o controle, mas não é o que queremos. Queremos salvar a empresa. E um acordo de acionistas para poder definir o CEO e manter as boas práticas para recuperar a empresa.

Quando vocês souberam da venda para a Mobly?
Faz um ano que estavam tentando um negócio com a Mobly. Mas tiveram problemas porque o conselho dos alemães que controla a empresa estava em sérias dúvidas em fazer a fusão com a Tok&Stok que, apesar da boa imagem que tinha, carregava essa dívida. Andava, não andava. No momento em que não andava, o Fernando disse pra nós: “então compra a minha participação?” Eu respondi: “não quero comprar, quero pôr dinheiro na sua companhia. Põe como a gente”. Ele disse: “não vou pôr, me dilua”. O que isso quer dizer, faz um aumento de capital.

Que é a proposta de vocês que está sob análise da Justiça.
Foi o que fizemos. Mas quando chegamos dizendo, ok, vamos pôr. Ele: “vai falar com os bancos”. Fomos falar há três meses. E chegamos a um acordo com os bancos, mas os bancos disseram: “quem define é o controlador. Como vocês estão com eles?” Nós dissemos: “muito bem, ele que nos falou para vir falar com vocês”. Mas quando reunimos tudo, nessas três semanas, a Mobly estava ressuscitando. E a SPX disse: esquece o aumento de capital, vamos fazer a fusão. E começou a desandar tudo.

Você se decepcionou com o comportamento do Fernando Borges e da SPX nesses últimos tempos?
Mas totalmente! Porque o Fernando só tem a visão dele. Não é da empresa. Ele está indiferente à Tok&Stok, que não é o nosso caso. O que quero dizer é que a nossa única visão é salvar a companhia de uma forma, com eles ou sem eles. Eles, não. Querem sair porque não acreditam mais. E não acreditam porque colocaram a companhia nessa situação. Eles falam que a Ghislaine não trouxe o resultado esperado, mas eles tiveram seis anos para demolir e, reconstruir tudo em um ano, é difícil. Estamos percebendo que está melhor. Em agosto, as vendas foram 30% acima do orçamento, pelo jeito. Mas não estou certo.

“Eles [SPX] querem sair porque não acreditam mais [na Tok&Stok]. E não acreditam porque colocaram a companhia nessa situação”

Por quê?
Porque não consigo ver os números neste momento. Me cortaram de tudo. Vamos conseguir ver o resultado do trimestre. É fraca a palavra desapontar, porque cortar a Ghislaine era desnecessário. Mas, tudo bem, vamos admitir que estávamos em rota de colisão. O Fernando não tem interesse na companhia, quer sair e virar a página. Write off.

Qual é a sua avaliação do Roberto Szachnowicz, um conselheiro que votou pela destituição da Ghislaine como CEO, portanto contra a família. E depois pelo aumento de capital na companhia, contra os interesses da SPX?
Minha avaliação é que quando o Roberto votasse contra a SPX ele seria destituído. E a visão que se tinha era que tinha coisa mais importante pela frente. Não que a Ghislaine não fosse algo importante, mas era reversível. O Roberto, que aprendi a conhecer cada vez melhor, estava tentando ver o que era o melhor para a companhia. Às vezes, estávamos alinhados, em outras não totalmente. Mas, no fim, ele estava contra o negócio da Mobly. Ele percebeu, porque era uma evidência. Pega a imagem do avião. Eles vão nos derrubar. Ou vão se derrubar sozinhos.

Mas, com a aprovação do Cade à fusão, a Mobly assumiu a Tok&Stok.
Eles não sabem tocar a Tok&Stok. Se soubessem tocar, porque a Mobly não é uma Tok&Stok? Eles compram de fornecedores de produtos, são commodity. E eles vão aplicar isso na Tok&Stok, que tem os seus próprios produtos. A gente não deixa vender a terceiros, mas os deles vendem para outros clientes, outras lojas. Não funcionamos assim. Tivemos reuniões com eles, que disseram que vão lançar produtos próprios, para melhorar a marca. Faz 10 anos que estão nesse negócio, porque descobriram hoje que tem de fazer isso?

É uma questão emocional?
Não é a questão emocional, somente. É a questão da credibilidade, da competência.

“Consideramos eles culpados de tudo o que aconteceu, então por que vamos ter de comprar?”

Em um cenário que a Justiça atenda o pedido da família Dubrule, como será o dia seguinte? Como será o clima com a SPX e a conversa entre vocês?
Não garanto pelo lado de lá, mas acho que tem acordo. Sempre falamos, o responsável disso é o Carlyle [SPX], não queremos comprar você. Queremos pôr dinheiro na companhia. Consideramos eles culpados de tudo o que aconteceu, então por que vamos ter de comprar? Hoje, poderíamos admitir e dizer: podemos fazer um acordo para vocês saírem dignamente, isso sim é uma das alternativas. Se for razoável, porque sabemos que há o aspecto da responsabilidade E como eles têm pavor da Tok&Stok, eles desconfiam.

Qual é o clima atual?
O clima hoje é: difícil ficarmos juntos. Não tanto por nós, mas por eles. Quando falamos que íamos pôr dinheiro na empresa, eles falam: “eles não vão. Falam isso, mas não vão pôr o dinheiro”. Não é verdade, não faz nenhum sentido. Eles falam porque não acreditam mesmo na Tok&Stok e acham uma loucura. O Fernando falou para mim em uma reunião: “não entendo, por que vocês não vão para a Riviera Francesa e abandonam isso tudo?” Eu respondi: “porque eu não sou você”. Ele não consegue imaginar que, para nós, não é a questão emocional, que existe. A gente acredita. É uma tristeza ver a empresa desaparecer. Porque a SPX quer sair do negócio, a Mobly precisa de uma boia para se salvar e a fusão é o abraço do afogado. Mas um acordo a gente consegue. Estamos dispostos a fazer um esforço porque aprendemos. Se tivermos de fazer isso, faremos.

E se for o contrário, se não der certo?
Se não der certo, se não der certo… Não vou dizer. Ainda tenho ideias, mas que não posso falar porque não sei se vai dar certo. Mas não vamos abandonar tão já para ver se conseguimos vingar nossa posição. Se realmente virmos que não temos opção nenhuma, a gente talvez busque outra solução. Mas não vamos desistir tão rápido de abandonar a Tok&Stok. Vamos achar a solução.

Pelo que você falou, se a Mobly está assumindo a gestão, a família Dubrule enxerga que a destruição de valor da companhia pode ser grande?
Com o Fernando a gente está tentando o acordo. E uma das coisas que a gente fala é que temos de fazer esse acordo antes que seja tarde demais. Não queremos recuperar uma terra arrasada. E você tem toda razão: tem um limite. Esperamos que tudo seja reversível. Estamos trabalhando com a hipótese de que vamos voltar. Vai dar certo.

“Uma das coisas que a gente fala é que temos de fazer esse acordo antes que seja tarde demais. Não queremos recuperar uma terra arrasada”

Quem foi a maior concorrente da Tok&Stok?
Durante os primeiros cinco anos nunca fizemos propaganda e a Tok&Stok funcionou porque não existia nada igual. E pretendo ainda não existe nada igual no Brasil. Mas tiveram tentativas diversas. No início perdemos funcionários e fornecedores para nos copiar. E nenhum deles sobreviveu. O maior que tivemos foi a Etna, que também fechou. Eles tinham dinheiro demais, até. Mas não foi bem administrada. Fizeram tudo enorme, de uma vez só. Nós crescemos aos poucos. Tínhamos lojas grandes porque fechávamos a pequena para fazer uma maior. Não queríamos ter muitas lojas. Foi um crescimento orgânico, devagar. E eles entraram de uma vez, sem experiência nesse business e perderam muito dinheiro. A Etna sempre perdeu. Podia, porque a família [Kaufman, dos controladores da Vivara] tinha muito. Não vou dizer que fazia mal [o negócio de móveis e decoração], porque me assustou. Foi o maior concorrente.

Como foi esse período de concorrência acirrada?
O interessante é que eu acho que foi a época que a Tok&Stok mais cresceu. Sabe por quê? Porque sempre fomos um negócio um pouco sozinho e para muita gente essa coisa [de móveis e decoração] era diferente. Quando teve a Etna, que fez muita propaganda, imediatamente as pessoas iam na Etna e visitavam a Tok&Stok, então aumentou o fluxo, aumentou a visibilidade da marca. Foi uma coisa muito boa. Mas acho ainda melhor eles não estarem mais (risos).

Por que os cinco executivos que comandaram a Tok&Stok não deram certo?
Pegando por ordem. O caso do [Luiz] Fazzio, que era um executivo que tinha muita experiência em hipermercado e corte de custos. Afinal, qual é a diferença de um mercado para o nosso negócio? Lá eles vendem a marca de todo mundo e só tem de ter uma operação logística muito boa, reposição de estoque, preço e custos. Ele entrou no Carrefour para salvar o Carrefour, que estava numa crise violenta. Ele era muito bom nisso. E entrou na Tok&Stok e aplicou a mesma regra: começou a cortar custos. Não estou brincando, ele cortou de tudo. E o que fazia diferença. Ele achava que as nossas coisas eram frescuras.

“O Carlyle queria fazer o IPO. Nós também, estávamos bem alinhados com o Carlyle, sem dúvida, mas não com o método”

Não houve transição?
A Ghislaine pensava em fazer uma transição de seis meses para explicar todos os detalhes, mas ele aceitou ela cinco dias. E tirou fora, dizendo: “vou resolver isso melhor”. Porque tinha de melhorar os custos e melhorar o resultado porque o Carlyle queria fazer o IPO. Nós também, estávamos bem alinhados com o Carlyle, sem dúvida, mas não com o método. Esse é o primeiro, que pediu demissão sozinho. Ele abandonou e só deixou a história de corte: de custos e até das árvores nas lojas.

As árvores são as frescuras a que você se refere?
Tínhamos árvores bonitas, para dar um ar natural nas lojas e ele cortou. Porque são frescuras que ele não entendia. Da mesma forma, a Ghislaine mostrava as prateleiras para ele, todas divididas por cor. Mas qual é a cor que mais vende?, ele perguntou. Preto. Então faz tudo preto. Tinha de funcionar por giro e o nosso business não é só isso. Tem os dados racionais e os estéticos e emocionais. Essa mistura do toque e do estoque, a emoção e a razão. O tok são os valores da emoção e da estética e o estoque são os racionais. E como ele tinha cortado muita da cultura, os que o sucederam nunca conheceram a Tok&Stok como era. Isso foi um problema.

Depois do Fazzio veio o Ivan Murias.
Sim. O primeiro foi o cortador de custo, o segundo foi o estrategista errado. Ele comprou uma empresa de tecnologia, para transformar a Tok&Stok em uma empresa de tecnologia e entrar na bolsa de valores como uma empresa de tecnologia. Os múltiplos eram muito melhores. Era 30 vezes o valuation de uma empresa de varejo. Então, tinha esse objetivo de transformação. O chairman da Tok&Stok [Daniel Sterenberg] na época nos vendeu e fazia sentido. De novo, estávamos de acordo em nos parecer mais tecnológicos. Pode ser, mas o meio…

O que deu errado?
Compramos essa empresa, porque estava difícil contratar pessoas de tecnologia. Veio essa startup e começamos a trocar tudo. Mas tudo funcionava. E ficamos com um site que não funcionava mais e sem a nossa operação de logística e gestão de loja. O sistema que tínhamos era um sistema colcha de retalho, mas totalmente adequado, integrado na operação, desenvolvido em casa. Fizemos um novo centro de distribuição em Extrema, para ter incentivos fiscais, mudamos para lá com o novo sistema que não funcionou. Aí foi a catástrofe. Veio a pandemia, não conseguimos entregar nada. A pandemia atrapalhou? Sim. Teria nos atrapalhado? Sim. Mas jamais como atrapalhou, porque não funcionava mais nada. O segundo foi o estrategista errado.

E o terceiro executivo?
Depois apareceu o Octávio Lopes, era um CEO de sucesso, fez a Equatorial, um IPO de sucesso. Era o nome ideal para levar o IPO para frente. Mas ele não entendia nada de varejo. Esse nunca tinha colocado os pés. Não tinha noção e não tinha modéstia, sinceramente, de saber que ele não sabia. Todo mundo pode não saber, mas ele não sabia que não sabia. Por exemplo, ele falou para nós que éramos bem-vindos para ajudar e disse: “vou chamar vocês”. Respondemos que estávamos à disposição. Nunca nos chamou. E, de novo, a cultura da empresa tinha desaparecido. Ele veio com a proposta de montar novas lojas, mas a gente via que a Tok&Stok estava se endividando, que estava mal. E ele ainda avisou do IPO, pisou no acelerador e abriu 20 lojas, de um novo modelo [Studio], que fechamos quase todos. Sobra uma na Paulista e uma em Brasília. E fez um monte de bobagens, acelerou e aí a dívida… incrível como vai rápido. Ele se deu conta e foi embora, para a Light.

O sucessor dele foi justamente o chairman, o Daniel Sterenberg, certo?
Veio o chairman, que surtou. O Fernando Borges sempre nos culpa: “vocês falam que somos nós, mas vocês quiseram ele. Eu tinha falado que não ia dar certo”. É verdade. Mas por que a gente falou? Porque cada vez ia se buscar o melhor do ramo, o melhor profissional, com currículo perfeito. Mas não aprendemos? Foram três em seguida e cada vez vamos cometer o mesmo erro, com alguém que não sabe nada. Nós temos alguém, que é o Daniel. E ele quer. Teve a mudança no Carlyle, no momento em que foi para a SPX. Ele quer e conhece, gosta da Tok&Stok. Foi ele que levou o deal para o Carlyle. E conversando com ele, a gente entendia que ele sabia o que tinha de fazer.

Novamente, o que deu errado?
Ele entrou lá, se perdeu, entrou em depressão e sumiu. Ficou sete, oito meses. Isso eu reconheço que o Fernando falou com a gente: ‘olha, ele não vai dar certo. Ele é do business de private equity, que se toma uma decisão a cada dois anos. No melhor dos casos, uma por ano. No varejo, você tem de tomar 10 decisões por dia. Ele não vai aguentar. Eu conheço ele bem”. Ele falou certo. Não conseguiu. As pessoas chegavam com pressão, de ter de fazer. Ele entrou em uma empresa muito mal. Não é ele que causa o problema, ele simplesmente não conseguiu endireitar.

Por fim, vem o Roberto Szachnowicz, com a experiência de ter comandado a Etna.
O Roberto apareceu indicado por um amigo, gostei dele e apresentei, mas ele não podia entrar imediatamente. Aí a Ghislaine entrou nessa ponte. E ela percebeu tudo o que tinha de fazer, ela é muito rápida, conhece a operação. Aí vendemos para o Carlyle [SPX] que a Ghislaine tinha de ficar e o Roberto passou a ser do conselho. Fizemos esse entendimento com ele e acho que foi muito melhor. O problema foram os três primeiros: o primeiro que tirou a cultura da empresa, o segundo que fez a estratégia errada e o centro de distribuição e o terceiro que fez a dívida aumentar.





Fonte: Neofeed

Continue Lendo

Negócios

A operação secreta que salvou obras de arte ucranianas da fúria de Vladimir Putin

Prublicadas

sobre

A operação secreta que salvou obras de arte ucranianas da fúria de Vladimir Putin
Tempo de Leitura:7 Minuto, 22 Segundo


Não se via uma investida tão virulenta contra o patrimônio cultural de uma nação desde a Segunda Guerra Mundial. Para Vladimir Putin, a Ucrânia não tem identidade própria — é apenas “uma parte inalienável de nossa própria história, cultura e espaço espiritual”, disse ele, em pronunciamento aos russos, três dias antes da invasão de 24 de fevereiro de 2022.

Há dois anos e sete meses, monumentos, museus, teatros, bibliotecas, igrejas, templos e edifícios de interesse arquitetônico são deliberadamente destruídos. Coleções são expropriadas e enviadas para a Rússia. Soldados das forças de Moscou pilham peças de arte e as vendem no mercado clandestino. O custo dos ataques contra os bens culturais da Ucrânia está, até o momento, em Є 3,2 bilhões, em cálculo feito pela Unesco em parceria com o Banco Mundial.

A Organização das Nações Unidas já condenou a “campanha de genocídio cultural para destruir a identidade da Ucrânia como país”, como definem alguns analistas. “Sejamos claros: o povo ucraniano tem direito à sua identidade. Ninguém pode violar esse direito”, defende a ONU.

Graças a uma rede de solidariedade formada por diretores de museus, curadores e acadêmicos, espalhados por toda a Europa, uma parte da herança cultural ucraniana está a salvo. Em uma operação deflagrada às pressas e feita às escondidas, enquanto cidades e vilas eram bombardeadas, eles conseguiram tirar algumas obras de arte do país — e levá-las para longe da sanha de Putin.

E, assim, depois de passar por Madri, Colônia, Bruxelas e Viena, a exposição In the Eye of the Storm: Modernism in Ukraine, 1900–1930s está hoje na Royal Academy of Arts, em Londres, onde fica até 13 de outubro.

De pinturas a óleo e esboços a colagens e projetos de cenários para o teatro, são 65 trabalhos de artistas já consagrados, como Kazymyr Malevych, Sonia Delaunay, Alexandra Exter e El Lissitzky, bem como de figuras menos conhecidas, como Oleksandr Bohomazov e Mykhailo Boichuk — “cada um dos quais deixou uma marca indelével na arte e na cultura do país”, lê-se no texto de apresentação da mostra.

In the Eye of the Storm é acima de tudo símbolo da resistência ucraniana. Não é a primeira vez que ameaçam apagar a herança cultural do país.

“Os ucranianos conquistaram o direito de criar sua própria identidade em lutas sangrentas, e somente agora, durante os últimos meses da guerra em grande escala, o mundo aceitou que a Ucrânia é um sujeito, e não um mero objeto, da história”, diz Timothy Snyder, historiador e professor da Universidade Yale, nos Estados Unidos, à plataforma de notícias Svidomi, sediada em Kiev.

No início do século 20, a Ucrânia se dividia entre os territórios ocidentais, sob domínio do Império Austro-Húngaro, e as regiões orientais, governadas pela Rússia Czarista.

“Mesmo na ausência de um único estado soberano, os ucranianos afirmaram sua identidade nacional por meio da preservação de sua língua e tradições e do desenvolvimento de sua cultura, incluindo a arte”, escreve Jennifer Mathers, professora de política internacional da Universidade Aberystwyth, no País de Gales, no artigo Evacuated artworks exhibit details attempts to wipe out Ukrainian culture — and shows what survives, publicado recentemente na plataforma The Conversation.

Depois da incorporação, em 1922, da Ucrânia à recém-criada União Soviética, os ucranianos ainda experimentaram, por quase uma década, a liberdade de poder ser quem eram: ucranianos. A arte então floresceu. Uma arte vivaz e eloquente, como se vê na mostra de Londres.

A tragédia do Holodomor

A partir de 1930, porém, um forte senso de identidade nacional fez a população se rebelar contra a política de coletivização dos bolcheviques, liderados por Joseph Stalin. Às manifestações ucranianas, o ditador comunista respondeu com leis agrícolas espúrias e matou por inanição quase 4 milhões de mulheres, homens e crianças, no chamado Holodomor — ou a Grande Fome

Enquanto isso, os russos deram início à destruição em massa da cultura ucraniana, inclusive com a “eliminação física de seus criadores”, como conta o historiador Volodymyr Viatrovych, à Svidomi. A justificativa: o “nacionalismo burguês” dos ucranianos.

Com as perseguições, prisões e assassinatos, a arte sofreu perdas catastróficas. “Por isso, nossa cultura é pouco conhecida no mundo”, diz o também historiador Vladlen Maraiev, em seu canal no YouTube, History Without Myths.

“Composição (Genova)”, de 1912, é de Alexandra Exter, uma das artistas ucranianas mais conhecidas (Reprodução royalacademy.org.uk )

Em 25 de março de 2024, um bombardeio russo destruiu o Museu Mykhailo Boichuk, em Kiev (Reprodução kdidpmid.edu.ua)

Tymofii Boichuk costumava retratar as tradições ucranianas, como o quadro “Mulheres sob a macieira”, de 1920 (Reprodução royalacademy.org.uk )

Desde o bombardeio, em março de 2022, o interior da Biblioteca Regional Infantil, antigo Museus de Antiguidades Ucranianas, está exposto à chuva e à neve (Reprodução cambridge.org)

Esboço da coreografia “Máscaras”, para a Escola de Movimentos de Bronislava Nijinska, de Kiev, foi feito por Vadym Meller, em 1919 (Reprodução royalacademy.org.uk )

Curadores e funcionários do Museu Maidan, na capital, vasculham os escombros em busca de artigos deixados para trás, para montar uma coleção sobre a vida e a morte dos ucranianos comuns (Reprodução maidanmuseum.org)

A tela “Afiando as serras”, pintada por Oleksandr Bohomazov, estava no Museu Nacional da Ucrânia antes de ser levado para a Europa (Reprodução royalacademy.org.uk )

Os pontos verdes indicam a localização de áreas com patrimônio cultural, na região das cidades de Kiev e Chernihiv. Já os vermelhos localizam áreas de ação militar russa (Reprodução cambridge.org)

“Mulher camponesa ucraniana” foi pintada por Volodymyr Burliuk, entre 1910-1911 (Reprodução royalacademy.org.uk )

A comparação entre a ameaça à cultura ucraniana na década de 1930 e hoje é inevitável. Mas há um diferença fundamental entre o passado e o presente, ambos terríveis. A Ucrânia conta agora com a ajuda de governos e sociedades ao redor do mundo. A prova do apoio está exposta nas galerias da Royal Academy of Arts.

Nascido em Kiev, o historiador Konstantin Akinsha, de 64 anos, é figura central na evacuação das obras modernistas. À iminência da invasão, de Budapeste, onde vive hoje, atualmente ele acionou seus contatos de dentro e de fora da Ucrânia. Com Yulia Lytvynets, diretora do Museu Nacional, decidiu organizar uma exposição itinerante.

Chuva de mísseis

Foram meses de uma troca intensa de telefonemas, e-mails e mensagens de WhatsApp com diretores de museus da Europa, em busca de espaço para a mostra. A primeira instituição a aceitar a exposição foi o Museo Nacional Thyssen-Bornemisza, em Madri. Agora, era preciso descobrir uma forma de levar as peças até lá.

“Isso era um grande problema porque não havia nenhuma companhia de seguros no mundo que segurasse qualquer coisa que passasse pela Ucrânia durante o bombardeio russo. Felizmente, tínhamos caminhões de transporte e carregadores profissionais, porque a empresa austríaca, Kunsttrans, havia criado uma filial em Kiev, antes da guerra”, escreve Akinsha, em In the Eye of the Storm—The Race to Save Ukraine’s Art Treasures, para a para o site da Trebuchet, ONG global dedicada a apoiar artistas locais, ao redor do mundo.

Ficou decidido que a evacuação dos trabalhos modernistas aconteceria na terça-feira, 15 de outubro de 2022. Às segundas, os russos costumavam bombardear Kiev. De manhã cedinho, Yulia carregou os caminhões. “Eles partiram”, avisou ela a Akinsha, algum tempo depois, “Achamos que éramos muito espertos”, lembra o historiador.

Meia hora depois da saída das obras, porém, uma chuva de mísseis russos despencou sobre várias cidades, inclusive a capital. Yulia e Akinsha passaram o dia acompanhando a remessa e monitorando o ataque dos invasores.

Às 10 e meia da noite, os caminhões finalmente chegaram à fronteira da Polônia. Naquele instante, um míssil desgovernado atingiu o território polonês. Imediatamente a travessia foi interrompida.

Luta feroz

“Através dos esforços estelares de diplomatas ucranianos, que acordaram todos os oficiais na Polônia (embora naquela noite eles não estivessem dormindo de qualquer maneira), os guardas da fronteira liberaram a passagem dos caminhões”, conta Akinsha. E, assim, as pinturas foram salvas — e, com elas, um pouco da identidade cultural da Ucrânia.

Se os modernistas estão protegidos em Londres, lá no leste europeu, os ataques ao patrimônio artístico da Ucrânia prosseguem, cada vez mais duros. Mas, mesmo sob ameaça constante, em meio à destruição e às pilhagens, os ucranianos não esmorecem na luta pela preservação de sua identidade.

Os curadores e funcionários do Museu Maidan, em Kiev, por exemplo. Quando os russos chegaram, eles esconderam todo o acervo da instituição. Hoje, vasculham os escombros em busca de objetos que contem a história dos ucranianos — uma coleção sobre a vida e a morte de pessoas comuns, em tempos de guerra. São roupas, sapatos, livros, objetos de casa, louças, bichinhos de pelúcia…

Como diz o diretor Ihor Poshyvailo, ao jornal inglês The Guardian, os artigos recolhidos “demonstram toda a crueldade russa, mas também explicam porque os ucranianos estão lutando tão ferozmente por sua liberdade”.



Fonte: Neofeed

Continue Lendo

Popular