Negócios
“Não podemos perder a janela de oportunidade aberta pela transição energética”, diz diretor do Ibram
A urgência climática disparou no mundo todo uma corrida por tecnologias de transição energética. E, no centro desse movimento, estão os chamados minerais críticos e estratégicos — lítio, níquel, cobalto e terras raras, entre outros.
Eles são fundamentais para a fabricação de produtos capazes de promover a real descarbonização da economia, como as baterias de carros elétricos e a infraestrutura necessária para os parques eólicos, por exemplo.
O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), em parceria com o Centro de Tecnologia Mineral (CETEM), do Rio de Janeiro, elaborou um estudo para subsidiar a elaboração de novos programas governamentais que fortaleçam a mineração e levem o país rumo ao futuro sustentável.
Intitulado Fundamentos para políticas públicas em minerais críticos e estratégicos para o Brasil, o documento já foi entregue à Comissão de Transição Energética, do Congresso Nacional.
“Analisamos o que foi feito em 17 países e na União Europeia, para entender o que seria recomendável também para o Brasil. Precisamos agregar valor à cadeia e não ficar só com a etapa da mineração”, diz o engenheiro de minas Julio Nery, diretor de sustentabilidade do Ibram. “Acreditamos que existe uma grande oportunidade que precisa ser aproveitada. Já perdemos outras, não podemos perder.”
Veja a seguir os principais trechos da conversa de Nery:
O que motivou a elaboração do relatório?
Com as evidências das mudanças climáticas, o mundo inteiro começou a pensar sobre minerais para a transição energética. Mas esse é um assunto antigo. A cada período da nossa história, ele volta. Houve os minerais críticos para a Segunda Guerra Mundial, por exemplo. E depois para a Guerra Fria. Hoje, o debate gira em torno de duas vertentes. Alguns países relacionam esses minerais à dependência econômica, mas a maioria se preocupa com a transição energética. Foi o que fizemos em nosso trabalho, relacionamos os estratégicos importantes para nossa balança comercial. Veja o que acontece com o potássio, usados na fabricação de fertilizantes e, consequentemente, essencial para o agronegócio: 95% do potássio que utilizamos vem de fora.
E quanto à transição energética?
Analisamos o que foi feito em 17 países e na União Europeia para entender o que seria recomendável também para o Brasil. Precisamos agregar valor à cadeia e não ficar só com a etapa da mineração. Acreditamos que existe uma grande oportunidade que precisa ser aproveitada. Já perdemos outras e não podemos perder a janela de oportunidade aberta pela transição energética.
A que perdas, o senhor se refere?
Na siderurgia, por exemplo. Temos jazidas de minério de ferro muito grandes e de excelente qualidade. Mas a nossa siderurgia avançou muito pouco ao longo do tempo. Nos anos 2000, o Brasil tinha capacidade instalada para produzir 30, 35 milhões de toneladas de aço. Os grandes produtores mundiais eram a China, Japão, Estados Unidos e Europa, cada um produzindo na faixa de 100 milhões de toneladas. Então a China disparou e hoje tem uma capacidade instalada na ordem de 1,3 bilhão de tonelada de aço. Em 2023, houve um excedente na produção chinesa e 100 milhões de toneladas foram colocadas no mercado para exportação. Isso causou um problema gigantesco para a siderurgia brasileira. Se a China, que está mudando sua economia do setor de infraestrutura para a de serviços, resolve colocar mais aço no mercado, isso vai ter uma influência muito negativa em cima dos produtores que não são chineses. Então, houve a oportunidade de crescermos em siderurgia, mas não soubemos aproveitá-la. Se tentássemos recuperar hoje, perderíamos dinheiro porque o produto chinês é mais barato.
Há quem questione o motivo pelo qual o Brasil só exporte minério de ferro e não aço.
Exportamos minério de ferro porque tem gente querendo comprar minério de ferro. Se eu fosse exportar aço, eu teria melhor rendimento? Não necessariamente. É aquela história: se você quer comprar uma geladeira, não adianta alguém te oferecer uma Ferrari pelo preço da geladeira. A necessidade dos chineses é comprar minério para produzir o aço. Então precisamos vender o que eles querem comprar — não o que queremos vender. Competir com eles hoje no aço não dá.
“Precisamos agregar valor à cadeia e não ficar só com a etapa da mineração”
Existe atualmente um movimento global de resistência à liderança da China nesses mercados. É uma boa oportunidade para o Brasil?
Diante da agressividade chinesa, a Europa resolveu que não quer ter mais de 65% do fornecimento de um insumo tido como crítico vindo de um só país. E a gente sabe que hoje 95% dos insumos críticos vêm da China. Então, se a Europa quer comprar de países que sejam próximos, tenham um regime estável e uma confiabilidade como fornecedores, o Brasil se encaixa nisso. Portanto, sim, essa é uma oportunidade para o Brasil. Também vemos os Estados Unidos buscando desenvolver frentes para comprar esses minerais de países com quem têm uma relação mais amigável. Recentemente recebemos no Ibram o representante da Secretaria de Estado de Energia americana, que sinalizou a intenção de fazer um acordo com o Brasil. Só não agora por causa da eleição, pois não seria ético.
No estudo, vocês mencionam a relação entre o desenvolvimento de uma política do setor minerário e a soberania nacional. Pode explicar melhor?
O agronegócio, por exemplo, é extremamente importante para a balança comercial brasileira e o setor depende do potássio, que importamos. Em 2022, quando começou a guerra na Ucrânia, o agronegócio foi ameaçado pois dois países que são fundamentais para o fornecimento de potássio para o Brasil: a Rússia e a Belarus, que, apesar de não estar envolvida na guerra, está na região e pode sofrer restrições de transporte. Felizmente não aconteceu nada disso. Mas, em termos geopolíticos, precisamos começar a repensar as decisões. É uma questão de segurança alimentar não só para o Brasil, como para o mundo. Afinal, somos hoje um dos celeiros globais na agropecuária.
Qual é a sua avaliação sobre as políticas públicas brasileiras para os minerais críticos e estratégicos?
Não podemos dizer que o Brasil não tem uma política pública para esses minerais. O Brasil tem, mas são várias. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços tem uma. O Ministério das Minas e Energia, outra. O Ministério da Ciência e Tecnologia, outra. Mas a gente precisa que elas conversem entre si. Se queremos, por exemplo, agregar valor ao lítio, que já exportamos, precisamos ter uma fonte de energia estável, de gás natural, para produzir carbonato de lítio. É isso que vamos usar na bateria, que não produzimos aqui. Além disso, tem a questão da infraestrutura. A gente precisa de estradas que consigam levar os insumos de forma rápida e barata. As rodovias cheias de buracos encarecem terrivelmente o custo do transporte. Para essa agregação de valor, precisamos ter aqui uma fábrica de baterias. E, qual é o maior produtor de bateria no mundo hoje? A China.
“Nosso principal produto de exportação mineral, o minério de ferro, não pode estar na lista do chamado ‘imposto do pecado’, junto com cigarro e a bebida”
É preciso rever, então, a política industrial brasileira?
É necessário uma política industrial que atraia essas indústrias para estabelecer no Brasil. Para isso, precisamos de estabilidade jurídica, de estabilidade tributária… O minério de ferro ganha um adicional com o Imposto Seletivo. Nosso principal produto de exportação mineral não pode estar na lista do chamado “imposto do pecado”, junto com cigarro e a bebida. O Imposto Seletivo é para aqueles produtos que queremos desestimular a produção. Precisamos que as regras sejam mais claras. Isso vale para os licenciamentos ambientais.
O senhor tocou agora em um ponto bastante sensível: o impacto ambiental e social causado pela mineração e a exigência para que a atividade siga os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU.
A mineração tem um potencial grande de poluição — em termos de ruído, poeira, estabilidade de encosta e de barragem, por exemplo. Precisamos criar formas para mitigar esse impacto, para que ele não ocorra. É claro que vai haver remoção de vegetação para fazer a exploração da mina. Mas é preciso ter técnicas que consigam fazer essa reabilitação da área depois.
Tem como zerar o impacto?
Zerar é impossível. Qualquer atividade humana tem impacto ambiental. No caso da mineração, ao implantar uma mina grande, vamos causar um impacto grande. Uma pode ter dois quilômetros de extensão; 200, 300 metros de profundidade… vai gerar um grande volume de rejeitos. Mas eu tenho que ter condições de fazer a reabilitação da área depois que essa estrutura estiver pronta. O parque Ibirapuera, em São Paulo, por exemplo, era uma área de lavra de areia, em 1958. E o que foi feito lá? Foi feita uma reabilitação e o parque foi criado em cima dessa área. Hoje você pode dizer que o parque não é sustentável? Não. Aliás é muito bem usado. Aqui, em Belo Horizonte, a gente tem um exemplo parecido, o Parque das Mangabeiras. Em Curitiba, o Parque Pedreira Paulo Leminski, onde está a Ópera de Arame. Eram todas áreas exploradas pela mineração.
Negócios
Infracommerce faz acordo com bancos e reestrutura dívida de R$ 641 milhões
A Infracommerce anunciou após o fechamento do mercado de segunda-feira, 7 de outubro, um acordo vinculante com seus principais credores – Itaú Unibanco, Santander, Banco ABC Brasil e Banco do Brasil – para reestruturar uma dívida de cerca de R$ 641 milhões, o que representa 85% do seu endividamento total.
Em fato relevante, a empresa anunciou ainda que Ivan Murias deixará o posto de CEO global para ocupar a presidência do Conselho de Administração. Em seu lugar, quem assume é Mariano Oziobala, que comandava a operação da companhia na América Latina.
Além de Murias, a empresa nomeou João de Saint Brisson Paes de Carvalho, que, entre outros postos, é presidente do Conselho de Administração da PDG Realty, como novo membro independente do seu board. A dupla substitui Peter Estermann, do Patria, que presidia o colegiado, e Pedro Jereissati.
“Fui convidado pelos bancos para assumir como chairman e, junto com o João, ajudar nessa nova fase, exercendo outro papel”, diz Murias, ao NeoFeed. “É sinal de que algo de bom foi feito até aqui.”
O movimento dá sequência ao memorando de entendimentos não vinculantes (MOU) divulgado em agosto pela empresa de full commerce na tentativa de alongar suas dívidas. Na época, o potencial acordo acompanhou uma “má notícia” dada pela companhia ao reportar seu resultado do segundo trimestre.
Sob o comando de Murias, que havia assumido como CEO quatro meses antes, a empresa incluiu um impairment de R$ 1,38 bilhão no balanço do período, fruto da série agressiva de M&As da empresa desde o seu IPO, em 2021, o que não foi bem digerido pelo mercado.
“Quando trouxemos à tona o tema da baixa contábil, que por muito tempo ficou encapsulado na operação, não se tratava do começo do problema, mas sim, da solução”, diz Murias, ao NeoFeed. “E esse fato relevante de hoje é a concretização dessa história.”
O acordo em questão será viabilizado pela constituição da Newco, veículo de gestão independente que irá consolidar as dívidas incluídas nessa reestruturação. E que, na prática, se tornará o único credor desse passivo.
A Infracommerce amortizará R$ 420 milhões do total de R$ 641 milhões por meio da dação em pagamento (uso de um ativo para quitar parte de uma dívida) à Newco das suas ações de emissão na New Retail Limited – o braço por trás dos seus negócios na América Latina –, que representam 83,6% do capital social nessa operação.
Nessa composição, o saldo remanescente da dívida, estimado em cerca de R$ 221 milhões, será usado posteriormente pela Newco em uma emissão de debêntures privadas que serão subscritas e integralizadas pelos bancos credores. E que terá vencimento de cinco anos a partir da sua data de emissão.
Segundo o fato relevante, as debêntures serão mandatoriamente conversíveis em ações ordinárias de emissão da Infracommerce e o preço por ação será equivalente à média ponderada do volume de papéis da empresa negociados nos 30 pregões anteriores.
O acordo abre ainda a possibilidade de adesão de outros credores considerados relevantes. E traz o compromisso dos quatro bancos credores de não tomarem qualquer medida judicial ou extrajudicial contra a empresa até a conclusão das obrigações previstas em seu plano de reestruturação.
Murias destaca que, com essa readequação da estrutura de capital, fruto de negociações que se estenderam por seis meses, a empresa afasta definitivamente qualquer risco de recorrer a uma recuperação judicial ou extrajudicial, algo que vinha sendo ventilado no mercado.
“Com o compromisso de conversão da dívida remanescente em equity, na prática, mesmo que por meio da Newco, é como se passássemos a ter esses quatro bancos como acionistas”, diz. “É um voto de confiança de que a estrutura de capital está acertada e também na gestão e no potencial do negócio.”
A Infracommerce também negocia um novo financiamento de até R$ 70 milhões, dividido em três tranches, junto à Geribá Investimentos, conforme informou em fato relevante divulgado no início de setembro. A expectativa é de que esse acordo seja fechado nos próximos dias.
“Há uma crença de que quem chegou teve a sabedoria de dar um passo atrás e construir um caminho de saída”, afirma o executivo. “Ao mesmo tempo, isso só foi possível porque os credores entenderam que essa gestão e esse board não foram os responsáveis pelo contexto por trás dessa crise.”
Equívocos e correções de rota
O executivo ressalta os méritos de Kai Schoppen – fundador da Infracommerce, a quem substituiu como CEO – e de seus pares, especialmente no roteiro que levou a empresa ao IPO, em maio de 2021. Mas aponta os erros cometidos após a oferta, que trouxe R$ 902 milhões para o caixa da companhia.
“A Infracommerce é uma empresa de prestação de serviços, que integra soluções de parceiros”, diz Murias. “E, com esse caixa generoso e a Selic em baixa, o grande equívoco foi acreditar que poderia desenvolver sua própria tecnologia.”
Em sua visão, ao eleger os M&As como o atalho para essa virada, a empresa também cometeu erros. Além do preço das aquisições e dos juros que, posteriormente, pesaram sobre o balanço, ele observa outra herança crítica associada a essa alocação desenfreada e equivocada dos recursos.
“A companhia trouxe diversas soluções, mas a integração desse portfólio ficou fora do radar”, diz. “E isso criou um desequilíbrio brutal, já que a empresa arrecadava como prestadora de serviços e alocava capital como uma desenvolvedora de tecnologia. E isso teve sequência com os follow ons pós-IPO.”
Na contramão dessa orientação, ele destaca que a operação na América Latina, comandada, até então, por Oziobala, seu sucessor, sempre foi tocada com o viés mais centrado em serviços e “muito pé no chão”. O que resultou em sistemas unificados, menos complexidade e resultados mais saudáveis.
Já no Brasil, após sua chegada e com o apoio da Bain & Company, Murias adotou medidas para começar a estancar os riscos. A empresa entregou um dos dois andares que ocupava no Centro Empresarial Nações Unidas, na zona sul de São Paulo, e demitiu cerca de 30% do seu time, especialmente no C-Level.
A Infracommerce também fechou quatro dos seus sete centros de distribuição, além de buscar a renegociação de preços e condições de contratos que representavam 35% de sua carteira, dada a percepção de que muitos desses clientes eram deficitários. Essa última etapa já foi concluída.
Ele ainda enxerga margem para potenciais reduções na área usada pelos centros de distribuição mantidos na operação. Bem como para novos cortes, na ordem de 10% a 15% da equipe, mais centrados no time operacional.
Outro passo em execução envolve a integração das tecnologias e ativos incorporados nos últimos anos. Esse processo passa também pela redução do número de parceiros que compõem o portfólio em áreas como pagamentos e logística, outro legado dos M&As realizados.
A ideia é eliminar a complexidade de opções à disposição dos clientes e tornar essa oferta mais eficiente e acessível. Em alguns casos, diz ele, 80% da carteira adotava a solução de um parceiro, enquanto os 20% restantes usavam outras alternativas do portfólio.
“Em pagamentos, por exemplo, nós operávamos com 9 parceiros. Vamos concentrar em três”, diz. “Vamos migrar para alguns pacotes principais que, por sua vez, vão nos permitir ser mais flexíveis e repassar parte dessa eficiência para o preço na ponta.”
Esse trabalho conta com a participação de Luiz Pavão, cofundador da Infracommerce, que foi nomeado como novo general manager da companhia no Brasil em setembro. Membro do conselho da empresa na América Latina, ele estava afastado do dia a dia da operação desde 2022.
“Quando cheguei, pedi para falar com pessoas que participaram dessa história e o Pavão foi uma das conversas mais lúcidas que tive”, conta Murias. “Lá atrás, ele criticou e se mostrou descrente na tese de crescimento inorgânico acelerado e acabou se afastando. Ter ele de volta é muito emblemático.”
Com esse reforço e o plano de zerar boa parte dos desafios operacionais para ingressar em 2025 pronta para se concentrar na retomada do crescimento da empresa, a estimativa é de que muitas das ajustes em curso sejam concluídos nos prazos de 30 a 60 dias.
Se o prazo estimado para finalizar essa etapa é curto, tudo indica que a Infracommerce tem um longo caminho a percorrer para recuperar a confiança do mercado.
Cotadas a R$ 16 na época do IPO, as ações da empresa fecharam o pregão da segunda-feira, 7 de outubro, na B3 cotadas a R$ 0,16, queda de 5,88% sobre o pregão anterior. Os papéis acumulam uma desvalorização de 91,3% em 2024, dando à companhia um valor de mercado de R$ 102 milhões.
Negócios
Risco de recessão nos EUA cai para 15% e pouso suave da economia fica mais próximo
O Goldman Sachs melhorou as suas perspectivas para o desempenho da economia americana neste ano e reduziu as chances de recessão do país em cinco pontos percentuais, para 15%.
A mudança de rota ocorreu após o Departamento de Trabalho dos Estados Unidos divulgar, na sexta-feira, 4 de outubro, que a criação de vagas de emprego aumentou em ritmo acelerado em setembro, atingindo 254 mil novos postos de trabalho no período. Essa foi a maior alta dos últimos seis meses.
Com a taxa de desemprego atingindo 4,1%, os dados acalmaram o medo do mercado de que a demanda por mão de obra estivesse mais fraca do que o esperado. Na visão do economista-chefe do Goldman Sachs, Jan Hatzius, o relatório “reestruturou a narrativa do mercado de trabalho”, afirmou o executivo em um relatório.
Com a nova perspectiva, o banco manteve sua previsão de que o Federal Reserve fará cortes consecutivos de 0,25 ponto percentual até que atinja uma taxa de 3,25% a 3,50% em junho de 2025. “Agora, vemos um risco muito menor de outro corte de 50 pontos-base”, disse Hatzius.
A opinião do banco vai de encontro com a perspectiva do mercado. De acordo com a ferramenta FedWatch do CME Group, 95,2% dos especialistas acreditam que o corte de novembro virá na casa de 0,25 ponto percentual. Antes do payroll, esse número estava em 71,5%.
“De forma mais ampla, não vemos razão óbvia para que o crescimento do emprego seja medíocre em um momento em que as ofertas de emprego são altas e o PIB está crescendo fortemente”, completou Hatzius.
Porém, a visão positiva não define resultados. No dia do anúncio, o presidente do Fed de Chicago, Austan Goolsbee, afirmou que os dados efetivamente vieram muito bons, mas que o banco central não pode reagir ao resultado de um dado isolado. O comentário foi feito à Bloomberg TV.
Segundo ele, o próprio Fed não sabe qual será a taxa neutra de juros na qual deverá se fixar. Porém, a maioria dos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC) sugere que a taxa atinja essa meta entre 2,5% e 3,5%.
Apesar das perspectivas positivas, outubro não deve ser um mês tão positivo quanto setembro, já que a temporada de furacões pode impactar o mercado como um todo, na visão do Goldman.
Negócios
Inteligência artificial ajuda mineração a “explorar” novas fronteiras
Todos os dias, trens da mineradora Vale circulam por cerca de 2 mil quilômetros de ferrovias, levando toneladas de minério de ferro, manganês e cobre, entre outros materiais. As duas estradas de ferro, sob concessão da companhia, operam em dois sentidos. Em um deles, as composições saem das minas com destino às usinas de beneficiamento. No outro, os vagões retornam vazios, para serem carregados novamente.
Em alguns pontos, a via é de mão única. É o caso da ponte sobre o rio Tocantins, na Estrada de Ferro Carajás, que liga a cidade de Parauapebas, no Pará, e o Terminal Marítimo de Ponta da Madeira, no Maranhão. Nessas condições, é preciso escolher qual dos trens vai parar para que o outro passe.
Até 2020, essa decisão era tomada pela equipe de funcionários da mineradora. “Os operadores tinham uma norma tácita de sempre parar o trem vazio”, conta Alexandre Altoé Pigatti, head de inteligência artificial e democratização da Vale, em conversa com o NeoFeed. O motivo: o acionamento do veículo carregado, depois da pausa, gastaria mais combustível. Até que a inteligência artificial (IA) entrou em jogo e surpreendeu os humanos.
“A IA identifica situações em que é melhor parar o trem carregado. Isso ocorre, por exemplo, quando ele está em um perfil de rampa compensada que seja declive. Nessa situação, a quantidade de diesel necessária para retirar o trem carregado da inércia pode ser menor do que para movimentar o vazio que por sua vez está num aclive”, explica Pigetti.
Dependendo do que for decidido em uma primeira parada, a tecnologia faz recomendações sobre como deve ser a dinâmica do restante do percurso.
Este caso é um dos muitos que mostram como a IA está transformando a mineração. Nos últimos sete anos, a ferramenta vem sendo usada para as mais diversas funções.
Desde as atividades administrativas, como a geração de relatórios, até as mais delicadas, como aquelas que exigem a exposição de funcionários a situações de risco, como o desmoronamento de uma rocha.
“A base de tudo está na capacidade que a inteligência artificial tem de correlacionar dados e apresentar conclusões que ajudam na tomada de decisão. E isso pode ser aplicado em inúmeras frentes”, afirma Tiago Fontes, diretor de ecossistema e marketing da Huawei do Brasil — a companhia chinesa é uma das maiores fornecedoras de equipamentos para redes e telecomunicações do mundo. “Como consequência, ganha-se em segurança, eficiência, sustentabilidade e economia de tempo e dinheiro.”
Determinadas atividades minerárias oferecem risco, como a operação de veículos gigantescos, a ida a áreas remotas (muito altas ou muito subterrâneas) e o transporte e o manejo de materiais que se contam às toneladas. Agora, essas funções começam a ser realizadas pelas máquinas — ou, pelo menos, com o suporte delas.
Um caso: depois de extraído, o minério precisa passar pelo britador. Trata-se de um equipamento gigantesco que quebra o material em pedaços menores, para facilitar o transporte. Embaixo dele, fica outra estrutura, chamada sapata, que recebe essas porções que foram partidas.
Faz parte do procedimento normal, entre uma etapa e outra uma pessoa entrar embaixo da sapata para verificar se as peças estão todas no lugar. “Por mais que isso só seja feito com equipamentos de segurança, existe sempre um risco de acidente”, diz Pigetti.
Desde 2021, quem realiza essa função é uma câmera de última geração. Programado, o equipamento identifica com acurácia possíveis danos ou erros de ajustes. Quando alguma coisa não está de acordo, a máquina soa uma alarme. Só então, um funcionário é designado a ir até a sapata para fazer o reparo.
Dispositivos que identificam problemas, aliás, estão entre as primeiras soluções de IA nas minas. Em 2017, a Vale colocou em uso detectores de possíveis danos em pneus fora de estrada, os caminhões enormes que fazem o transporte do material minerado.
Eles acusam, por exemplo, o risco de furo, antes do pneu furar, economizando assim alguns milhões de reais. Além do gasto com o reparo, o custo de parar a operação quando algo importante quebra é altíssimo. “Hoje, os modelos conseguem predizer um rasgo, por exemplo, com até duas semanas de antecedência”, afirma Pigetti.
Atualmente, os caminhões fora de estrada funcionam com diversas outras funções orientadas por IA. Entre elas, recomendações aos operadores sobre as melhores velocidades por trecho. Assim é possível não só evitar acidentes, como otimizar o consumo de combustível e reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Fora das minas
A IA também continua operando para fora das minas. No porto, antes de abastecer um navio, é preciso avaliar a umidade em que o minério que será transportado se liquefaz para, assim, ajustar as condições do ambiente. Esse procedimento evita que a carga derreta e provoque o afundamento da embarcação durante o trajeto.
Antigamente, essa medição era feita exclusivamente em laboratório em uma análise que podia durar até três horas. Só depois do resultado, a carga era liberada. Um prejuízo e tanto, já que, por hora, são carregadas 16 toneladas de minério de ferro. Desde 2020, o cálculo de umidade é feito por IA, que emite o resultado em minutos, evitando que a operação fique parada.
“O teste continua sendo realizado no laboratório, apenas para fins burocráticos e, em 97% dos casos é exatamente o mesmo daquele identificado pela máquina”, garante Pigetti. Segundo a companhia, os ganhos com as soluções de IA já ultrapassaram os R$ 300 milhões.
A IA também tem facilitado o trabalho nos escritórios. Sistemas de democratização de tecnologias permitem que usuários dos mais variados cargos usem aplicativos de suporte. Alimentados com manuais técnicos, por exemplo, assistentes virtuais emitem gráficos, relatórios, preparam material para reuniões e respondem perguntas específicas como normas técnicas.
Tecnologias assim agilizam o trabalho e evitam que uma pessoa abra mão de tempo criando algo ou executando uma tarefa mais elaborada para fazer algo que pode ser delegado a um robô. Mais do que isso: essas ferramentas ajudam a suprir a carência que o setor tem por algumas funções dentro e fora da mina.
“Hoje em dia, faltam profissionais em diversas áreas da mineração. Os jovens não querem mais ocupar atividades de risco ou que exigem ir a campo”, afirma Bartira Carvalho, gerente de vendas regional na Datamine, fornecedora de softwares para mineração, compartilha da opinião. “Existe ainda uma carência de mão de obra especializada e que pode ser suprida por tecnologias que carregam histórico de dados complexos.”
Junto com as facilidades, porém, vem o receio de perder postos de trabalho humano para as máquinas. “O medo está em quem vê a IA como fim e não como meio”, diz ao NeoFeed, João Camilo Costa, head de soluções digitais da Innomotics, empresa que desenvolve e fornece soluções em eletrificação, automação e digitalização para a mineração.
E ele completa: “Há quem diga que o ser humano vai ser completamente substituído pela IA. Na minha opinião, quem vai desaparecer são as pessoas que não têm a tecnologia como aliada”.
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