Negócios
As lições de tênis (e de vida) de Roger Federer
Um dos maiores tenistas do planeta, o suíço Roger Federer definiu como “lições do tênis” seu discurso para os formandos de 2024 do Dartmouth College, em New Hampshire, nos Estados Unidos. Mas ele está errado — ou foi modesto demais.
Os 25 minutos do pronunciamento, naquela manhã chuvosa de domingo, 9 de junho, são uma aula de vida (o NeoFeed escolheu três lições no vídeo com legendas que está abaixo).
Longe dos torneios oficiais desde setembro 2022, aos 42 anos, o ex-atleta compartilhou a filosofia que o levou a sagrar-se oito vezes campeão de Wimbledon, ao terceiro lugar no ranking dos maiores vencedores de Grand Slam da história e ser um dos “big three” do tênis global, ao lado do amigo Rafael Nadal e de Novak Djokovic.
Um cartilha para dentro das quadras, claro, mas, sobretudo, fora delas, que pode ser acompanhada no documentário Federer: Doze Últimos Dias, com estreia prevista para o próximo dia 20, no Prime Video, a plataforma de streaming da Amazon.
Com bom-humor, graça e generosidade, diante de 11 mil pessoas (mais 7,7 mil via satélite), Federer garantiu que não existe conquista sem esforço — derrubando o mito de que “ganhava sem suar”, o que sempre o frustrou muito.
Defendeu que a perfeição não existe — ele venceu 80% das 1.526 partidas jogadas, mesmo assim conquistou apenas 54% dos pontos disputados.
E, por fim, mostrou que o seu mundo sempre foi além das quadras.
Que as viagens, a cultura, as amizades e a família são infinitamente mais gratificantes do que a vitória de qualquer partida.
Sendo o tênis um esporte mental, Federer falou sobre foco e determinação, os ensinamentos trazidos pelas derrotas e a importância de se correr riscos, experimentar e se divertir.
Colocou-se lado a lado dos formandos e se disse também em um momento de transição. Os jovens, pelo fim da graduação, e ele, pela aposentadoria — palavra da qual, aliás, Federer não gosta.
Elogiado por sua elegância e gentileza, dentro e fora de quadra, o ex-tenista não foi a New Hampshire apenas para discursar. A universidade lhe concedeu o título de doutor em humanidades, por seu trabalho filantrópico. Em 2003, aos 22 anos, ele lançou a Roger Federer Foundation.
Criada na África do Sul, país natal de Lynette, mãe do esportista, a organização capacita crianças por meio da educação. Presente em seis países africanos e na Suíça, ao longo das últimas duas décadas, a entidade já atendeu quase 3 milhões de meninas e meninos e ajudou a formar 55 mil professores.
“Doutor’ Roger… De todas as minhas vitórias, essa deve ser a mais inesperada”, brincou ele, arrancando risos da plateia.
O NeoFeed selecionou os trechos mais importantes do discurso de Federer, como mostra a seguir:
Fora da zona de conforto
Só vim aqui para fazer um discurso, mas posso voltar para casa como “doutor” Roger. Esse é um bônus muito bom. “Doutor Roger’”… De todas as minhas vitórias, essa deve ser a mais inesperada.
Estou um pouco fora da minha zona de conforto hoje. Essa não é minha cena habitual e estas não são minhas roupas habituais. O manto é difícil de vestir.
Lembrem-se de que tenho usado shorts quase todos os dias, nos últimos 35 anos.
Aposentado, não. Graduado
Eu deixei a escola aos 16 anos para jogar tênis em tempo integral. Então, nunca fui para a faculdade, mas me formei recentemente. Me formei em tênis.
Eu sei que a palavra é “aposentar”: “Roger Federer se aposentou do tênis’” Aposentado… a palavra é horrível.
Vocês não diriam que se aposentaram da faculdade, certo? Parece terrível.
Assim como vocês, terminei uma grande tarefa e estou passando para a próxima. Assim como vocês, estou descobrindo o que é isso.
Formandos, sinto sua dor. As pessoas me perguntam: “Agora que você não é tenista profissional, o que você faz?” Eu não sei— e não há problema em não saber.
Então, o que eu faço com meu tempo? Primeiro sou pai, então acho que levo meus filhos para a escola. Jogo xadrez online contra estranhos. Passo aspirador na casa. Estou adorando a vida de um graduado em tênis.
Eu me formei em 2022 e vocês, em 2024, portanto, tenho uma vantagem para responder à pergunta sobre o que vem a seguir. Hoje, quero compartilhar algumas lições nas quais confiei durante essa transição.
Espero que sejam úteis para vocês, para além de Dartmouth.
O mito do “sem esforço”
“Sem esforço” é um mito. Digo isso como alguém que já ouviu muito essa expressão.
As pessoas diziam que meu jogo era fácil. Na maioria das vezes, elas estavam me elogiando. Mas costumava me frustrar quando comentavam: “Ele quase não suou!” ou “Ele está mesmo tentando?”
A verdade é que tive de trabalhar muito para que tudo parecesse fácil. Passei anos choramingando, xingando, jogando minha raquete, antes de aprender a manter a calma.
Ganhei essa reputação porque meus aquecimentos nos torneios eram tão casuais que as pessoas não achavam que eu estava treinando duro. Mas eu estava trabalhando duro — antes do torneio, quando ninguém estava olhando.
Espero que, como eu, vocês tenham aprendido que “sem esforço” é um mito. Não cheguei aonde cheguei apenas com talento. Cheguei lá tentando superar meus adversários.
Eu acreditei em mim mesmo. Mas a crença em si mesmo tem de ser conquistada.
O prazer das vitórias mais difíceis
Houve um momento em 2003 em que minha autoconfiança realmente entrou em ação. Foi no ATP Finals, onde apenas os oito melhores jogadores se classificaram.
Derrotei alguns dos melhores tenistas focando em seus pontos fortes. Antes eu fugia dos pontos fortes deles. Se um cara tivesse um forehand forte, eu tentaria acertar o backhand dele.
Mas agora, eu tentaria ir atrás do forehand dele. Tentei vencer os atacantes atacando.
Eu me arrisquei fazendo isso. Então por que eu fiz isso?
Para amplificar meu jogo e expandir minhas opções. Você precisa de todo um arsenal de forças, para que. então, se uma delas falhar, você ainda ter alguma coisa. A verdade é que tive de trabalhar muito para que tudo parecesse fácil.
Quando o seu jogo está funcionando assim, vencer é relativamente fácil.
Mas, há dias em que você simplesmente se sente quebrado. Suas costas doem, seu joelho dói… talvez você esteja um pouco doente… ou com medo. Mas você ainda encontra uma maneira de vencer.
E essas são as vitórias das quais mais podemos nos orgulhar. Porque provam que você pode vencer não apenas quando está no seu melhor, mas especialmente quando não está.
Disciplina como talento
Sim, o talento é importante. Não vou dizer que não. Mas talento tem uma definição ampla. Na maioria das vezes, não se trata de uma dádiva. É uma questão de ter coragem.
No tênis, um ótimo forehand com uma velocidade incrível na cabeça da raquete pode ser chamado de talento.
Mas no tênis, como na vida, a disciplina também é um talento. E a paciência também. Confiar em si mesmo é um talento. Abraçar o processo, amar o processo, é um talento.
A pior derrota
Você pode trabalhar mais do que imaginou ser possível e ainda assim perder.
O tênis é brutal. Não há como negar o fato de que todos os torneios terminam da mesma maneira: um jogador ganha um troféu. Todos os outros jogadores voltam para o avião, olham pela janela e pensam: “Como diabos eu perdi?”
Imagine se, hoje, apenas um de vocês tivesse um diploma. Parabéns, formando de 2024! Ao resto de vocês, os outros mil, mais sorte para vocês da próxima vez!
Para mim, uma das maiores derrotas foi a final de Wimbledon, em 2008. Eu versus Nadal. Alguns consideram-no o melhor jogo de todos os tempos. OK, todo respeito a Rafa, mas acho que teria sido muito melhor se eu tivesse vencido.
Perder em Wimbledon foi muito importante, porque vencer em Wimbledon é tudo.
Perdi Wimbledon. Perdi minha classificação número um. Mas eu sabia o que tinha de fazer: continuar trabalhando, continuar competindo.
Os 54% de pontos
No tênis, a perfeição é impossível. Nas 1.526 partidas de simples que disputei em minha carreira, ganhei quase 80% delas.
Agora, tenho uma pergunta para todos vocês: ‘Qual a porcentagem de pontos que vocês acham que eu ganhei nessas partidas? Apenas 54%.
Em outras palavras, mesmo os tenistas mais bem classificados ganham pouco mais da metade dos pontos que jogam.
Quando você está jogando, um ponto é a coisa mais importante do mundo. Essa mentalidade é realmente crucial, porque libera você para se comprometer totalmente com o próximo ponto e o próximo depois disso, com intensidade, clareza e foco. Os melhores do mundo não são os melhores porque ganham todos os pontos.
A verdade é que, seja qual for o jogo que você jogue na vida, às vezes você vai perder. Um ponto, uma partida, uma temporada, um trabalho… é uma montanha russa, com muitos altos e baixos.
Os melhores do mundo não são os melhores porque ganham todos os pontos. É porque sabem que vão perder uma vez ou outra e aprenderam a lidar com isso. Você aceita isso.
Chore se precisar, mas depois force um sorriso. Siga em frente. Seja implacável. Adapte-se e cresça. Trabalhe mais. Trabalhe de maneira mais inteligente.
Muito além das quadras
Uma quadra de tênis é um espaço pequeno. 2.106 pés quadrados [196 m², aproximadamente], para ser exato. Trabalhei muito, aprendi muito e corri muitos quilômetros naquele pequeno espaço.
Mas o mundo é muito maior que isso. Mesmo quando eu estava começando, eu sabia que o tênis poderia me mostrar o mundo, mas o tênis nunca poderia ser o mundo
Eu sabia que, se tivesse sorte, talvez pudesse jogar competitivamente até os 30 ano, talvez até 41. Mas mesmo quando estava entre os cinco primeiros, era importante para mim ter uma vida.
Uma vida gratificante, cheia de viagens, cultura, amizades e principalmente família. Nunca abandonei as minhas raízes, e nunca esqueci de onde vim. Mas também nunca perdi o apetite de ver esse mundo tão grande. O tênis nunca poderia ser o mundo.
Minhas experiências fora das quadras são as que levo adiante. Os lugares que pude conhecer, a plataforma que me permite retribuir e, acima de tudo, as pessoas que conheci ao longo do caminho.
O tênis, como a vida, é um esporte coletivo. Sim, você está sozinho do seu lado da rede. Mas o seu sucesso depende da sua equipe. Seus treinadores, seus companheiros de equipe, até mesmo seus rivais. Todas essas influências ajudam a fazer de você quem você é.
Uma família é uma equipe.
Graduandos, sei que o mesmo se aplica a vocês. Ao sair para o mundo, não se esqueçam: vocês podem trazer tudo isso com vocês. Essa cultura, essa energia, essas pessoas, esse verde [a cor da universidade].
De um graduando para outros
Estou aqui para lhes dizer que deixar um mundo familiar para trás e encontrar novos é incrivelmente profundo e maravilhosamente excitante.
De um graduando para outro, seja qual for o jogo que você escolher, dê o seu melhor. Experimente tudo.
E acima de tudo, sejam gentis uns com os outros. Divirtam-se.
Negócios
Regulamentação da energia eólica offshore tem “jabutis voando” para todos os lados
Em uma votação marcada pela força dos lobbies do setor elétrico que atuam no Congresso Nacional, o Senado aprovou nesta quinta-feira, 12 de dezembro, o projeto de lei 576/21, que regulamenta a geração de energia eólica offshore no Brasil, considerada uma das fronteiras tecnológicas mais promissoras do setor de energia renovável.
A euforia por abrir um mercado potencial que pode movimentar entre US$ 40 bilhões e US$ 168 bilhões no País até 2050, dependendo do aporte de investimentos, segundo estudo divulgado em julho pelo Banco Mundial, acabou ofuscada por uma série de “jabutis” – temas sem relação direta com o objeto da lei -, que acabaram sendo incorporados ao PL.
Assim, com votação simbólica, os senadores aprovaram uma lei que vai custar R$ 650 bilhões ao País até 2050 em benefícios para segmentos que nada têm a ver com as eólicas offshore, incluindo a contratação de térmicas a gás natural inflexíveis e de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), além de expandir subsídios ao carvão até 2050.
Na ponta do lápis, de acordo com cálculos da consultoria PSR, os jabutis vão acrescentar R$ 25 bilhões por ano na conta de luz dos consumidores, representando um aumento de 11% no custo da energia no Brasil – item responsável por 25% dos gastos de uma família.
“Na prática, a lei aprovada equivale à adoção de uma nova bandeira vermelha de longo prazo na conta de luz”, afirma ao NeoFeed Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia – coalizão formada por 16 entidades que representa todas as classes de consumidores -, resumindo a indignação do setor.
As oito emendas, incluídas originalmente na Câmara dos Deputados e agora referendadas pelo Senado, obrigam o governo a contratar energia cara, desnecessária e poluente, que vai ampliar as emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico em 25%.
As manobras ao longo do processo legislativo causaram revolta nas entidades ligadas ao setor elétrico. O PL ficou hibernando um ano no Senado, em meio a pressões do setor das eólicas offshore – para que fosse votado logo para dar segurança jurídica aos investidores – e das entidades, que exigiam a supressão dos jabutis.
Prejuízo duplo
Lucien Belmonte, da União pela Energia, entidade que reúne 70 associações da indústria, aponta outros impactos causados pelos jabutis.
“Para o consumidor, o prejuízo é duplo, com aumento na conta de luz e nos produtos que ele consome, pois todos têm um custo relacionado à energia para produzi-lo, do pão (27,2% do preço) ao vestuário (12,4%), por exemplo”, diz.
Já para o setor industrial, o aumento do custo de energia impacta na margem em relação à competitividade global, em especial dos produtos chineses. “A indústria sofreu dois aumentos de custos consecutivos pelo Congresso: com a aprovação do mercado de carbono, para descarbonizar a economia; e com esses jabutis do PL, que vão carbonizá-la”, acrescenta Belmonte.
Dos oito jabutis, três preveem iniciativas onerosas e totalmente dispensáveis. A contratação compulsória 4,9 gigawatts (GW) de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), por exemplo, vai custar R$ 140 bilhões.
A construção de uma planta de hidrogênio, com contratação obrigatória de 250 megawatts (MW), deve consumir mais R$ 28 bilhões. Outros R$ 140 bilhões serão destinados à contratação de 300 MW de energia eólica na Região Sul.
Numa mostra da força dos lobbies, outros dois jabutis ampliaram benefícios que já estavam assegurados por lei. A contratação compulsória de térmicas a gás inflexíveis, por exemplo, já previa a utilização de 8 GW condicionada ao preço teto e necessidade do sistema.
No novo arranjo, a contratação compulsória caiu para 4,25 GW, mas com inflexibilidade de 70% – ou seja, vão ficar funcionando a maior parte do tempo, mesmo sem precisar – e sem o preço teto, o que vai onerar o sistema em R$ 155 bilhões.
Outro benefício se deu com a prorrogação da contratação de térmicas a carvão. Uma lei anterior autorizava a continuação da operação da usina Jorge Lacerda até 2040. O PL das Eólicas Offshore incluiu mais duas usinas na lista, Candiota III e Figueira, além da extensão do prazo de operação até 2050, ao custo de R$ 92 bilhões.
Nos últimos momentos antes da votação, a prorrogação de concessão de subsídios para renováveis e para projetos de micro e minigeração distribuída (MMGD), que havia sido retirada pelo relator, senador Weverton (PDT-MA), voltou a pedido do PL e do senador Irajá (PSD-TO).
O congressista já havia incluído a medida no projeto lei do Combustível do Futuro, que acabou sendo derrubada pela Câmara. Com isso, o projeto de lei foi aprovado com R$ 71 bilhões a mais em jabutis do que antes de ir a plenário.
Há, porém, uma esperança derradeira: o veto aos jabutis na sanção da lei, que será assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O senador Randolfe Rodrigues declarou no plenário que as emendas serão vetadas pelo Executivo e, em última instância, judicializadas.
“Desgovernança energética”
Luiz Augusto Barroso, CEO da consultoria PSR e ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) – órgão vinculado ao Ministério das Minas e Energia que realiza estudos para subsidiar o planejamento energético do País –, afirma que os jabutis das eólicas offshore nasceram de outro PL, da privatização da Eletrobras.
“Houve um acordo implícito entre o governo anterior e o Legislativo, aceitando aprovar a privatização da Eletrobras em troca da inclusão desses jabutis em votações futuras”, diz.
Barroso adverte que a sucessão de benefícios aprovados por lobbies do setor elétrico no Congresso está criando uma “desgovernança energética”, na qual o planejamento do setor passa a ser definido pelo Legislativo, fora das competências técnicas dos órgãos reguladores, como o Operador Nacional do Sistema (ONS), EPE e Ministério das Minas e Energia.
“Os jabutis no setor energético está criando o hábito de o País comprar oferta sem ter demanda que a respalde”, afirma. “Isso desequilibra o sistema, o balanço entre oferta e demanda, a tarifa, o preço de energia e a capacidade de se fazer previsões.”
O especialista aponta alguns exemplos de como os jabutis aprovados vão impactar o setor. O primeiro deles é drenar recursos oriundos de aumentos tarifários que deveriam ser usados para gerar resiliência aos impactos adversos das mudanças climáticas.
Outro efeito é o agravamento do crescimento desordenado da geração distribuída (GD), que obriga o ONS a cortar o excesso de geração das energias renováveis ligadas ao sistema para equilibrar a oferta à demanda.
“Ao obrigar a compra compulsória de nova geração de térmicas inflexíveis, a lei aprovada reduz eventuais necessidades futuras de energia reserva que poderiam ser ocupadas por outras renováveis, incluindo as próprias eólicas offshore”, afirma Barroso.
Ou seja, a ampliação e uso obrigatório de térmicas devem aumentar os cortes de fornecimento de energias renováveis, o chamado curtailment: “Da forma como a lei ficou, seria melhor que não fosse aprovada, os custos dos jabutis são maiores que os benefícios que as eólicas vão trazer”, sentencia Barroso, lembrando do enorme potencial disponível para as eólicas onshore, em terra firme.
O setor de eólica offshore, por sua vez, prefere ver o copo meio cheio. Há muita expectativa de investimentos bilionários para instalar as pás gigantes no litoral brasileiro, apesar de os custos operacionais dos parques eólicos marítimos serem praticamente o dobro dos instalados em terra – com valores anuais de aproximadamente US$ 70 a US$ 80 por kilowatt (kW) instalado para offshore e US$ 30/kW a US$ 40/kW para onshore.
O Ibama recebeu, até a última semana de novembro, 98 pedidos formais de licenciamento de parques eólicos em alto-mar. Juntos, esses projetos pedem autorização para instalar 15.501 torres, o equivalente a 234,2 GW – maior que a capacidade total da matriz elétrica brasileira, de 207,7 GW.
Para Elbia Gannoum, residente executiva da ABEEólica (Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias), o novo marco regulatório trará para a indústria a segurança jurídica necessária para que o País possa atrair investidores.
“Era algo que esperamos há três anos e que agora se concretiza como viável e necessário para o Brasil”, afirma Gannoum, reiterando que a entidade espera que, na sanção presidencial sejam retiradas todas as emendas que não sejam exclusivamente relacionadas às eólicas.
Para Roberta Cox, diretora de políticas do Global Wind Energy Council (GWEC) – entidade que representa o setor a nível global -, a aprovação do marco legal do setor abre caminho para atrair investimentos não só de desenvolvedores como de todas a cadeia naval de implementação, como de indústrias ligados à produção de hidrogênio verde.
“Só a Petrobras cadastrou dez projetos no Ibama, há ainda interesse de outras gigantes do setor, como da Shell, Equinor, TotalEnergy, além de sondagens de empresas do norte da Europa e dos Estados Unidos”, diz.
Cox afirma que o País possui um dos maiores potenciais do mundo para a geração de energia eólica offshore, com mais de 1.200 GW disponíveis, de acordo com o Banco Mundial. Segundo o GWEC, cada GW instalado representa um investimento de € 2,5 bilhões na economia brasileira.
A diretora da GWEC, porém, lamenta que o projeto tenha sido aprovado com os jabutis. “Mas é importante ressaltar que não foi incluído nnehum estímulo para a energia eólica offshore, todo o investimento será privado”, diz.
Para Barroso, da consultoria PSR, porém, as emendas colocadas no projeto de lei aprovado vão manchar a imagem da nova fonte renovável: “A energia eólica offshore no Brasil será sempre lembrada como a filha dos jabutis.”
Negócios
Suzano quer menos “M&As grandiosos” e mais foco na desalavancagem
Em seu primeiro investor day desde que assumiu o comando da Suzano, em julho deste ano, Beto Abreu afirmou que a companhia não fará grandes movimentos de aquisição, destacando que o foco está na redução da alavancagem financeira e de custos operacionais do negócio.
“Não vamos implementar na nossa estratégia nenhum movimento significativo em termos de crescimento inorgânico”, disse ele na quinta-feira, 12 de dezembro. “Não temos no pipeline nenhum acordo transformador.”
Isso significa que, em vez de movimentos como a aquisição da International Paper, que criaria uma gigante com um valor de mercado de quase US$ 44 bilhões (mas envolveria um cheque volumoso, na casa dos US$ 15 bilhões, conforme noticiado à época), a empresa pretende apostar em movimentos como a compra da Pactiv Evergreen, por US$ 110 milhões, e de 15% da Lenzing, por R$ 1,3 bilhão.
No caso, serão movimentos em que a companhia possa gerar escala, trazendo suas capacidades operacionais e que possa extrair sinergias. É o caso da Pactiv, em que a Suzano vem trabalhando para ter opções de novas linhas de produtos em até cinco anos.
“Nós consideramos, por exemplo, que acordos que fizemos como da Pactiv e da Lenzing são saudáveis, com equilíbrio entre risco e crescimento no exterior”, disse Abreu. “Queremos alocar capital preservando a tendência do processo de desalavancagem.”
Também novato na cadeira, tendo assumido o posto no final de novembro, o CFO da Suzano, Marcos Assumpção, disse que a alocação de capital será o grande desafio da Suzano indo adiante. Mas ele destacou que a estratégia da companhia seguirá a mesma, com as decisões precisando obedecer os critérios de agregação de valor e com o pagamento do preço justo.
Ele destacou ainda os esforços da companhia de reduzir a alavancagem financeira da Suzano, que no terceiro trimestre alcançou 3,2 vezes em reais, visando alcançar o patamar de 3 vezes. Parte disso vem do fim dos vultosos investimentos para o Projeto Cerrado, nova fábrica de celulose da companhia em Mato Grosso do Sul.
A companhia também destacou que pretende implementar iniciativas para reduzir o custo caixa, apostando em iniciativas como mecanização na parte de silvicultura e aumentando a autossuficiência em madeira.
“O custo de capital é uma vantagem competitiva muito importante para a Suzano e não queremos arriscar isso, considerando que estamos numa indústria intensiva em capital”, afirmou Assumpção.
Como parte dos planos, a Suzano também vem trabalhando para concluir alguns investimentos anunciados, como é o caso da construção da fábrica de papéis higiênicos em Aracruz, no Espírito Santo, anunciada em outubro de 2023.
Ao custo de R$ 650 milhões, a planta deve ficar pronta no quarto trimestre de 2025, antecipando em alguns meses o plano inicial, o primeiro trimestre de 2026, fortalecendo a presença da Suzano na parte de bens de consumo, cujo maior movimento foi a compra das operações da Kimberly Clark no Brasil em 2022.
Por volta de 12h40, a ação SUZB3, da Suzano, recuava 2,29%, a R$ 62,63. No ano, os papéis acumulam alta de 13,6%, levando o valor de mercado a R$ 79,2 bilhões.
Negócios
Startup de “carros voadores” embarca novo aporte de US$ 430 milhões (e a Stellantis vai de carona)
As startups de aeronaves elétricas de pouso e decolagem vertical (eVTOL), ainda têm algumas escalas a cumprir para colocarem seus “carros voadores” nos céus, em operações comerciais. Mas não faltam investidores embarcando recursos para que essa tendência decole no mercado.
O mais novo nome a reforçar esse movimento é a Archer Aviation. Fundada em 2020, a startup americana anunciou na quinta-feira, 12 de dezembro, que levantou um novo investimento de US$ 430 milhões. O aporte chega apenas cinco meses depois de um aporte de US$ 230 milhões, liderado pela Stellantis, montadora de veículos de marcas como Fiat, Peugeot e Citroën.
A montadora também está pegando carona nessa nova rodada, assim como a United Airlines, que já integrava o captable da companhia. Entre os novos investidores figuram a Wellington Management e a 2PointZero, holding dos Emirados Árabes Unidos.
Com o aporte, a Archer Aviation, que abriu capital em Nova York por meio de uma Special Purpose Acqusition (SPAC) em setembro de 2021, chega a um volume de aproximadamente US$ 2 bilhões captados.
Parte dos recursos anunciados hoje será aplicada em outro projeto anunciado hoje pela startup. Trata-se de uma parceria com a também americana Anduril, empresa da área de tecnologia de defesa, para o desenvolvimento de aeronaves militares híbridas, na categoria dos eVTOLs.
De acordo com as duas companhias, o projeto tem como alvo um potencial registro da aeronave em um programa de aquisições do governo americano, aprovado e autorizado no âmbito do Departamento de Defesa dos Estados Unidos.
Ao ressaltar que a cadeia de suprimentos já desenvolvida e a experiência da Anduril vão acelerar o desenvolvimento do projeto, a Archer Aviation também informou que a iniciativa será tocada dentro do Archer Defense, um programa lançado recentemente pela companhia.
Com outro projeto de um eVTOL de cinco lugares em curso, a startup destacou ainda que encerrou o terceiro trimestre com US$ 502 milhões no caixa. E acrescentou que, agora, está bem posicionada, com um dos “principais balanços” do setor e sem necessidades de novas captações no curto prazo.
“Com a Anduril ao nosso lado e esse novo influxo de capital, aceleraremos o desenvolvimento e a implantação de tecnologias aeroespaciais avançadas em escala”, afirmou, em nota, Adam Goldstein, fundador e CEO da Archer Aviation.
Após chegarem a cair mais de 5% na Bolsa de Nova York, as ações da Archer Aviation registravam ligeira queda de 0,14% por volta das 10h37 (horário local), cotadas a US$ 7,38. Em 2024, os papéis acumulam, porém, uma valorização de 20,1%, dando à companhia um valor de mercado de US$ 3,1 bilhões.
Em outros exemplos mais recentes de startups capitalizadas da área, no início de outubro, a também americana Joby Aviation levantou US$ 500 milhões junto à Toyota, montadora japonesa que já investia na operação.
Já a brasileira Eve, fruto de um spin-off da Embraer e com capital aberto também na Bolsa de Nova York, onde está avaliada US$ 1,3 bilhão, captou um total de R$ 700 milhões em duas tranches, com um intervalo de nove dias, junto ao BNDES.
O primeiro contrato, de R$ 500 milhões, terá como destino a construção da fábrica de eVTOLs da empresa em Taubaté, no interior de São Paulo. Já o segundo financiamento será aplicado no desenvolvimento do carro voador da fabricante.
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