Negócios
A tesoura que une Trump a Lula
O primeiro sinal no Brasil da confirmação da vitória do candidato republicano Donald Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos, detectado já na manhã desta quarta-feira, 6 de novembro, chamou a atenção de analistas e agentes do mercado financeiro – um aumento na cotação do dólar, que chegou a R$ 5,862, antes de cair ao longo do dia.
A escalada da moeda americana, uma tendência também verificada em outros países, é atribuída à expectativa global da implementação das políticas protecionistas prometidas por Trump, com aumento de impostos para a importação de diversos bens e serviços nos EUA, entre outras medidas que seguramente vão afetar a economia interna e mundial.
O efeito no médio prazo dessas medidas – como aumento do déficit fiscal e a elevação das taxas de juros nos EUA – até explica a valorização do dólar mundo afora, registrando alta de 1,8% em relação ao iene japonês, 1,1% contra o dólar australiano e 2,1% contra o euro.
O dólar alto com a eleição do Trump, porém, teve ainda outro efeito no Brasil, ao jogar mais pressão sobre o pacote de corte de gastos que a equipe econômica está preparando para preservar as metas do arcabouço fiscal para 2025.
Não bastasse a dificuldade do governo de escolher programas e áreas a serem contemplados pela tesoura fiscal, os efeitos na economia global previstos com a vitória de Trump, com sua agenda protecionista, abrem uma nova frente de preocupações com o eventual impacto na condução da política fiscal brasileira.
O governo, que aguardava o resultado da eleição americana e da reunião, nesta quarta, 6 de novembro, do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central – que aumentou em 0,5 ponto percentual a taxa Selic, para 11,25% ao ano – para anunciar as medidas, deve ampliar os cortes neste novo cenário.
Economistas consultados pelo NeoFeed admitem que a vitória do candidato republicano na mesma semana que o governo deve anunciar ajustes fiscais há muito esperados pelo mercado não ajuda a melhorar as expectativas para 2025.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, afirma que há consenso de que a gestão Trump tende a ser inflacionária, porque combina expansão fiscal, fechamento comercial – com imposição de tarifas de 10% para importação de produtos – e controle de imigração.
Esse combo, segundo ele, limita espaço para queda de juros e deve dificultar a vida dos bancos centrais em todo o mundo, incluindo o brasileiro. Com isso, aumenta o cenário de aversão a riscos, com menos fluxos para mercados emergentes. Neste aspecto, prejudica o Brasil.
“Num cenário global tranquilo, o governo poderia fazer um ajuste fiscal gradual, em etapas e sem muita pressa, mas a vitória republicana coloca pressão para que o ajuste seja feito mais rapidamente”, afirma o economista-chefe do BV.
Padovani observa que essa pressa existe porque uma das vulnerabilidades atuais da economia brasileira é a tendência de alta da dívida pública, que passará também a ser alimentada pela expansão fiscal do governo Trump. “Na prática, o governo vai precisar entregar mais do que quisesse fazer.”
Assim como o economista-chefe do BV, muitos analistas acreditam que o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, teria menos espaço para reduzir as taxas de juros em comparação ao cenário hoje desenhado.
Os juros mais elevados tendem a valorizar o dólar e, por tabela, nos títulos do Tesouro americano, causando um efeito nas taxas de juros a nível global – incluindo o Brasil.
Meta fiscal sob risco
Alex Agostini, economista-chefe da agência de risco Austin Rating, também reconhece que a vitória de Trump vai afetar a política fiscal brasileira. Mas acredita num efeito mais agudo a partir do ano que vem, após a posse do novo presidente americano, quando ele deve anunciar medidas concretas.
“Talvez, em 2025, fique mais difícil para o governo brasileiro atingir a meta fiscal, até pelo desarranjo global que pode ocorrer em razão desse elevado grau de incerteza que as medidas de Trump devem causar”, diz Agostini.
Em relação à política fiscal, o economista adverte que as opções de ajustes estão ficando limitadas. “Ou o governo divide esse ônus com o Congresso Nacional por meio de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) ou faz um programa de concessões e privatizações mais amplo ou vamos continuar com a política fiscal expansionista, com juros acima de 12% no início do ano que vem”, diz Agostini.
Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, também vê o pacote fiscal a ser anunciado pelo governo ganhando mais importância com o resultado da eleição presidencial americana.
“O pacote terá o condão de melhorar as perspectivas do mercado para juros e dólar, mas tem de vir, entretanto, em bases realistas e relevantes, no mínimo R$ 40 bilhões para 2025 e com medidas que se perpetuem, que sejam estruturais”, adverte.
Salto, porém, afirma que a elevação inicial do câmbio no País deve ser inserida num quadro de maior volatilidade dado pelas eleições americanas que, a seu ver, tende a se dissipar à medida que Trump começar a governar: “O Brasil tem uma diplomacia profissionalíssima e isso conta muito.”
Negócios
Números Falam #31 – Junior Durski, CEO do Madero, e Ariel Szwarc, CFO do Madero
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Negócios
XP se une a três executivos ex-Santander e reforça ligação com o agronegócio
O agronegócio não tem importância apenas para o PIB brasileiro. Entre os clientes ligados ao agro atendidos pelas assessorias de investimento da XP, 25% são empresas com mais de R$ 100 milhões de faturamento.
Se o agro ajudou a XP a ganhar market share no investment banking, estruturando dívidas como CRAs e CRIs para o setor enquanto os grandes bancos consideravam o segmento pequeno e difícil, chegou o momento de olhar com mais cuidado para o wealth management. E a estratégia para agregar tudo isso é o B2B.
E surgiu uma oportunidade para a XP ampliar a sua rede de assessoria de investimentos focada no agronegócio com três ex-executivos do Santander. Eles lançaram a Sogima, assessoria de investimentos que nasce totalmente dedicada aos clientes do agronegócio, e plugada à XP.
“Eu realmente me surpreendi: XP no agro? Mas fomos conversando e percebi que há uma grande estrutura e ao mesmo tempo uma grande oportunidade de crescimento na rede”, afirma Ricardo França, sócio fundador da Sogima, ao NeoFeed.
França, que era superintendente regional de agronegócios do Santander, foi convencido por dois colegas de trabalho no banco, David Mailler Bocalon e Clemilson Franco, a empreender.
Neste início, eles estão movimentando a própria carteira de relacionamento e deram início a conversas com cerca de 90 potenciais clientes. A sede da Sogima será na capital paulista, mas os sócios planejam abrir escritórios no interior – embora ainda não tenham um destino definido.
Nos próximos meses, eles saem em busca de contratações de assessores que conhecem o agro para ajudar na meta de chegar a R$ 1 bilhão de captação em dois anos.
Para a XP, que criou mesas específicas de atendimento, como as de hedge cambial e commodities, para o cliente agro para o seu B2B, o diferencial está nas soluções customizadas para esse público, que não encontra o que procura nas grandes instituições financeiras.
“Já temos a Nexgen muito forte em Goiânia, e a Rio Negro em Campo Grande e agora temos a Sogima atuando mais no interior do Sudeste. E assim a gente ocupa bem esse tabuleiro”, afirma Bruno Ballista, sócio e head de assessoria e relacionamento com o cliente XP.
Atualmente, os clientes agro dos escritórios parceiros da XP estão localizados principalmente nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás e Paraná. E as principais soluções demandadas são commodities, operações compromissadas, renda variável, câmbio e produtos estruturados.
A Sogima nasce atendendo clientes pessoas jurídica e física ao mesmo tempo, e tendo como estratégia explorar o crédito colateralizado para ajudar produtores a se financiarem.
Na visão de França, o agronegócio cada vez mais procura o mercado de capitais, já que as linhas subsidiadas pelo governo são limitadas a R$ 3 milhões por CPF ou CNPJ, o que só atende ao micro produtor rural.
“Os muito pequenos têm acesso a linhas do governo, como tem que ser. E os grandes têm acesso ao mercado de capitais com grandes bancos. Há um vácuo para os players médios, e achamos que há uma grande oportunidade aí”, diz ele.
A crise do agronegócio, que registrou um boom de recuperações judiciais neste ano, não preocupa o sócio-fundador da Sogima. Ele vê um ciclo natural desse mercado, que apenas não era notado pelo setor financeiro antes porque não havia ninguém lá. E com a atenção conquistada nos últimos anos, muitos aventureiros entraram nesse mercado.
“O agronegócio é cíclico. Mas o que aconteceu este ano não foi uma quebra de safra, foi muito aventureiro que alavancou e deu problema. Os produtores mais maduros já passaram por isso e estão preparados para fases ruins”, afirma França.
Negócios
O preço da morosidade: governo desiste de construir hidrelétrica de R$ 2,5 bilhões em Mato Grosso
BRASÍLIA – Depois de 13 anos de tentativas para licenciar a construção da usina hidrelétrica Castanheira, projeto de R$ 2,5 bilhões que seria construído na região nordeste do Mato Grosso, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) resolveu desistir do plano.
O NeoFeed obteve detalhes do caso, que teve seu desfecho final na sexta-feira, 13 de dezembro. A EPE, órgão que é vinculado ao Ministério de Minas e Energia, pediu o cancelamento formal de registro da usina, sob argumento de que a Secretaria do Meio Ambiente (Sema) do Mato Grosso teria imposto uma série de dificuldades para licenciar a obra ao longo dos últimos anos.
Segundo a EPE, a secretaria ambiental agendou e cancelou, em dois momentos, as audiências públicas que seriam realizadas para discussão do projeto, além de não ter emitido um parecer técnico sobre o empreendimento.
Paralelamente, a construção da hidrelétrica na região norte do Mato Grosso, próximo ao Estado do Amazonas, também sofreu um revés com a Fundação Nacional do Índio (Funai). Depois de uma série de audiências e visitas a terras indígena da região, a Funai havia dado sinal verde para o projeto em 2022. Em 2023, porém, a nova diretoria da fundação suspendeu o ato anterior e colocou todo o processo em suspenso.
Ao formalizar a desistência do processo para a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a EPE relatou dezenas de encontros e pedidos sobre a usina realizados desde 2011, quando obteve autorização para elaboração dos estudos de viabilidade técnico-econômica do projeto.
Nos últimos 13 anos, conforme cálculos apresentados, a estatal diz que foram gastos mais de R$ 15,4 milhões de dinheiro público para estudar a hidrelétrica, envolvendo a mobilização de centenas de pessoas, contratações de terceiros e levantamento de dados técnicos. Tudo isso, agora, será inutilizado.
Prevista para ser erguida no rio Arinos, um dos principais afluentes no Juruena, a hidrelétrica Castanheira tinha capacidade projetada de 140 megawatts de energia, potência capaz de atender ao consumo elétrico de cerca de 1,9 milhão de pessoas, o suficiente para atender o consumo residencial de capitais como Recife (PE) ou Porto Alegre (RS).
A usina previa a construção de um reservatório de 94,7 km², nos municípios de Juara e Novo Horizonte do Norte, em Mato Grosso. De acordo com os dados técnicos, a hidrelétrica não interferia diretamente em unidades de conservação ambiental, terras indígenas ou áreas urbanas dos municípios.
“Fica evidente a complexidade de temas tratados no âmbito do licenciamento ambiental da hidrelétrica Castanheira, assim como a diversidade de interlocutores envolvidos no processo”, diz a EPE. “Por mais de uma década a EPE empenhou esforços em diálogos com os órgãos envolvidos no licenciamento.”
Em fevereiro de 2024, a Sema sinalizou que faria o arquivamento do licenciamento da usina, por causa da “inércia do interessado”. Em abril, a EPE apresentou contrapontos e pediu que a secretaria revisasse sua posição. Paralelamente, o órgão federal acionou a Casa Civil do Estado do Mato Grosso, para reforçar o interesse na obra e reclamar da “impossibilidade de debate sobre o projeto e a ausência de oportunidade de pactuar os compromissos”.
Em resposta, a Casa Civil encaminhou uma manifestação da Sema, que manteve o indeferimento por “não atendimento das solicitações de estudos complementares”. Segundo a EPE, a secretaria ambiental não apresentou justificativas sobre os pontos elencados pela autarquia federal.
Sobre os estudos indígenas, a EPE afirma que ocorreram visitas a várias aldeias da região, em maio de 2022, para os povos Rikbaktsa, Kayabi, Apiaká e Munduruku. “As reuniões contaram com a participação das comunidades e principais lideranças indígenas, de profissionais da empresa de consultoria responsável pelos estudos, representantes da Funai (Sede e Regional) e da EPE”, afirma.
A Funai aprovou o Estudo de Componente Indígenas e considerou que a oitiva foi realizada com êxito. No entanto, em março de 2024, a EPE diz que “foi surpreendida”, quando “a Funai informou a revisão dos seus posicionamentos expressos em julho de 2022, sem que fossem apresentados fatos novos ou justificativa técnica para motivar tal mudança de entendimento”.
Com a desistência, a EPE afirmou que os estudos de engenharia realizados, incluindo levantamentos de campo, investigações geológicas, além das informações socioambientais e de sondagens manuais e mecânicas, estão armazenados na autarquia, mas que o material deverá ser doado ou descartado após o cancelamento do processo.
“A EPE se compromete a disponibilizar os estudos até então realizados para que a sociedade possa ter conhecimento dos dados apurados e eventualmente possam utilizá-los futuramente”, afirmou a autarquia à Aneel. “Por todos os motivos elencados não há justificativa para a EPE continuar conduzindo o processo deste projeto.”
A decisão do governo federal de colocar a obtenção da licença prévia ambiental de projetos hidrelétricos sob responsabilidade da EPE se deve, justamente, à sensibilidade do tema, principalmente quando se trata do bioma Amazônia.
Ao entrar diretamente no processo de licenciamento, o governo federal quer mostrar aos investidores que o projeto é viável e seguro. Logo, o empreendimento pode ir à leilão, porque já tem uma chancela que sinaliza a sua viabilidade. Foi tudo o que não ocorreu neste caso.
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