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SAF não existe para dar lucro, mas para criar valor, diz Pedro Mesquita, da Exa Capital

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pedro mesquita paulista de jundiaí
Tempo de Leitura:12 Minuto, 47 Segundo


A criação da Lei da Sociedade Anônima de Futebol (SAF), em 2021, trouxe à tona um novo modelo societário para adequar os clubes brasileiros, a maioria endividado e gerido de forma amadora, aos desafios mercadológicos e financeiros de um negócio que movimenta R$ 53 bilhões na economia do País, de acordo com a consultoria EY.

Em três anos, os clubes geridos por SAF já começam a ocupar espaço relevante na elite do futebol nacional. Oito dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, o mais rentável, adotaram esse modelo: América (MG), Atlético (MG), Bahia, Botafogo, Cruzeiro, Cuiabá, Fortaleza e Vasco da Gama, além do Red Bull Bragantino, que se tornou clube-empresa.

E quem teve participação relevante nesse processo foi Pedro Mesquita, CEO e sócio do gestora Exa Capital, criada, neste ano, para investir em negócios do esporte, agro e real este – a ambição é chegar a R$ 5 bilhões sob gestão em dois anos.

Quando ainda era chefe do banco de investimento da XP, Mesquita assessorou, em dezembro de 2021, o Cruzeiro na venda de 90% das ações da SAF para o grupo comandado por Ronaldo Fenômeno – hoje, o clube mineiro foi vendido para Pedro Lourenço, dono do Supermercados BH.

“Clube de futebol é um ativo no qual se investe como num ativo escasso, semelhante a um quadro de um grande pintor”, afirma Mesquita, nesta entrevista ao NeoFeed. “Para valorizá-lo, o investidor precisa gerar receita para pagar as dívidas do clube, contratar jogadores e ganhar títulos. Essa criação de valor é o que dará retorno ao investidor na eventual venda desse clube.”

No início do mês, a Exa assinou um Memorando de Entendimento (MoU) para aquisição de 90% da SAF do Paulista, de Jundiaí – tradicional clube do interior paulista, campeão brasileiro da Série C (2001) e da Copa do Brasil (2005), mas que está afundado em dívidas e disputando o equivalente à quinta divisão do futebol estadual.

A dívida potencial do Paulista, 80 vezes equivalente à receita anual – que assustaria qualquer investidor de outro setor da economia -, não preocupa Mesquita. “Quanto pior a situação de um clube, maior é o valor que se pode criar dentro de um ativo, principalmente se ele tem potencial, como o Paulista”, assegura o empresário, para quem a dinâmica de negócio no futebol é diferente.

A tendência, diz o empresário, é que a maioria dos clubes virem SAF, por causa do modelo profissional de gestão, que gera resultados no campo, incluindo títulos. “Os clubes grandes, endividados, vão perceber que as chances de caírem para a Série B vão aumentar cada vez mais.”

Leia, a seguir, trechos da entrevista, na qual também abordou o mercado externo e a invasão das bets, as casas de apostas, no futebol:

A compra do Paulista de Jundiaí pelo modelo SAF ainda não está concluída. O que falta para a Exa assumir o controle?
Não chegamos na parte final do contrato porque ainda estamos “abrindo as gavetas” para ver o tamanho da dívida. Não sabemos ao certo, mas a dívida gira em torno de R$ 80 milhões por ano, sendo que o faturamento anual não passa de R$ 1 milhão. Ou seja, é uma dívida que precisa ser renegociada, ou via recuperação judicial ou outro instrumento. Mas já definimos os termos para a compra e estamos no processo de diligência, que vai demorar uns quatro meses para concluir. Só depois saberemos o aporte que tem de ser feito.

A maioria dos clubes grandes que viram SAF tem uma dívida gigantesca. Por que são esses os que mais atraem interesse de investidores, como seu fundo?
Como fundo, não vou ser hipócrita, nosso objetivo é obter retorno – e ele virá a partir do que se investe e se consegue extrair de valor no longo prazo. Basicamente, é uma situação na qual, pelo fato de o clube estar endividado, é possível fazer um bom negócio. Renegociar uma dívida envolve um risco muito grande. E tem a questão que o atual processo de virar SAF no futebol brasileiro ainda é muito novo. A SAF acaba sendo a última opção para os clubes endividados.

Veja alguns trechos da entrevista com Pedro Mesquita, CEO da Exa Capital

Já temos nove times da Série A do Campeonato Brasileiro sob o modelo de SAF ou de clube-empresa. Qual é a tendência no médio prazo?
Vislumbro que, no médio e longo prazo, a maioria das SAFs – não digo todas – terá mais sucesso do que a maioria dos clubes sem SAF. Isso vai criar um desequilíbrio, o que vai fazer com que mesmo os clubes que não estão numa situação tão difícil comecem a olhar a SAF com outros olhos.

Em que sentido?
Na média, as SAFs tendem a ter muito mais sucesso que o modelo associativo. Temos dois bons exemplos: o Red Bull Bragantino, que adotou uma gestão privada diferente da SAF e já se solidificou na Série A, é um deles. Outro é o Bahia, clube que sempre figurou entre a primeira e a segunda divisão, e hoje como SAF dificilmente vai voltar a disputar rebaixamento. A tendência é de os clubes grandes, endividados, olhando esse movimento, percebam que as chances de caírem para a Série B vão aumentar cada vez mais.

Como é o cenário do modelo semelhante ao de SAF no exterior?
Lá fora o futebol já é privado. Entre os grandes clubes do mundo, apenas dois – Real Madrid e Barcelona – continuam como associação. O Real já é uma associação “quase SAF”, com uma gestão muito boa. O Barcelona é, vamos dizer, um pouco mais bagunçado em relação a dívidas e desempenho. Todo o resto é privado. O campeonato de maior sucesso do mundo, a Premier League (Inglaterra), que tem maior faturamento e os maiores craques, é inteiramente privado.

A lei da SAF foi criada em 2021. O que impede um clube brasileiro de ir além e fazer IPO?
A lei brasileira autoriza fazer IPO de qualquer ativo privado, inclusive de uma SAF. A grande questão é se há demanda de investidores por IPO de um clube de futebol. No mundo todo, há poucos clubes que são abertos em bolsa, é muito raro [o Borussia Dortmund, finalista da Liga dos Campeões em 2023/24, é um exemplo].

Por quê?
Porque o clube de futebol não é um ativo que vai te gerar lucro. Basicamente, quanto mais receita, mais Ebitda, mais investimento no próprio futebol. A tendência é que todos os clubes fiquem no “zero a zero” – esse é o caso de um clube bem administrado, pois o objetivo é ser competitivo e contratar bons jogadores. A questão é a valorização do ativo.

A valorização do ativo então se sobressai em relação ao lucro no futebol?
Costumo comparar um clube de futebol com o quadro de um grande pintor. Quanto melhor o pintor, quanto mais escasso o ativo, maior é a demanda. Então, quanto maior o clube, maior sua torcida, maior a demanda de investidores. Ou seja, os grandes valores – os grandes clubes – são escassos. Então é uma teoria de escassez, muito mais do que uma teoria de geração de lucro.

Como o investidor de bolsa entende essa lógica?
Ele vai olhar o lucro, mas não tem lucro… Como assim? Ele vai ser dono de um bem, de uma pequena parte de um ativo escasso. Porque a grande atratividade de ser dono de um ativo é poder explorar as sinergias que aquele ativo te gera. Já um sócio super minoritário não consegue extrair isso. Por isso que não existe demanda, nem no mundo nem aqui, de IPO de clube de futebol.

Quais são os principais impulsionadores para um clube gerido por SAF passar a dar lucro para o investidor e títulos para a torcida? Existe uma receita?
Essa é a grande questão. O torcedor acha que o clube que virou privado vai dar lucro. Nenhum clube grande no mundo dá lucro, ou quase nenhum. Clube de futebol é criação de valor. No limite, o clube vai usar o lucro do ano para reinvestir no próprio clube, e não para gerar dividendo. Torcedor tem de entender que o investidor compra um clube para que esse ativo se valorize e, um dia, se ele quiser, vendê-lo ou não.

“Nenhum clube grande dá lucro, pois o ganho é usado para reinvestir no clube, e não para gerar dividendo”

Como o investidor vai tornar esse ativo mais valioso?
Montando estrutura, centro de treinamento, ganhando mais títulos. Mas se trata de uma teoria completamente diferente daquela de se olhar uma empresa, porque ela vai dar lucro e gerar dividendo com a solidez.

Então, a compra de um clube no modelo SAF, para o investidor, tem dois objetivos: criar valor para esse ativo e depois passar para frente. Não foi o que o Ronaldo acaba de fazer com o Cruzeiro?
Se um investidor quiser passar o clube para frente, ele pode passar com valorização de ativo, por ter mudado o patamar daquele clube que estava no vermelho. O caso do Ronaldo, no Cruzeiro, é exemplar: subiu o clube para a primeira divisão, fez um trabalho magnífico de redução de dívida, por meio de uma recuperação judicial, reestruturou a categoria de base e melhorou o centro de treinamento. Mas ele tomou seus riscos – o Cruzeiro poderia não ter subido ou até caído para a terceira divisão. No meio desse processo houve um comprador que quis pegar o ativo para valorizá-lo ainda mais. O Ronaldo nem tinha a intenção de vendê-lo agora, mas foi uma questão de oportunidade.

Entre os clubes que viraram SAF temos um exemplo que destoa: o Vasco, que rompeu com a gestora 777, fundo americano que havia comprado o clube e não fez os aportes prometidos. Qual sua avaliação desse caso?
A primeira coisa que um clube interessado em virar SAF precisa saber é de onde vem o dinheiro e quais são os planos desse investidor. Na época da transformação do Cruzeiro em SAF, a 777 fez uma proposta. Como assessor da XP contratado pelo Cruzeiro para escolher o investidor, preferi o Ronaldo, dentro de um contexto: tinha muito mais credibilidade e experiência no futebol, embora não fosse o investidor mais capitalizado naquele momento. Fizemos uma análise criteriosa da 777 e não conseguimos identificar quem entendia de futebol lá dentro nem de onde vinha o dinheiro. Infelizmente, quem assessorou o Vasco escolheu a 777. De qualquer forma, mesmo fazendo diligência e fechando um bom contrato, quem vai comprar pode fazer um trabalho ruim.

Quem precisa evoluir mais no futebol brasileiro em direção à profissionalização: os dirigentes, comissão técnica ou atletas?
Nosso futebol é reflexo da sociedade brasileira, do ponto de vista prático. Temos menos educação e mais desigualdade se comparado a outros países. A profissionalização do futebol vai obrigar todos que dele participam que também se profissionalizem. Há dez anos, um ou outro clube tinha treinador estrangeiro. Hoje, eles são maioria, pois os treinadores estrangeiros são mais bem formados, estudam mais. A mesma coisa são as reclamações com arbitragem. Não acredito que haja conluio ou armação. O que existe no Brasil é uma arbitragem de péssima qualidade, até porque ela é amadora. Na Inglaterra, por exemplo, o juiz de futebol é profissional, treina e vive como um atleta de clube, focado em melhorar. Por isso que a arbitragem é melhor lá fora.

O mesmo vale para dirigentes?
Sem dúvida, não vai ter espaço para amadorismo. Flamengo e Palmeiras são clubes que não são SAF e estão muito bem administrados, com dívida sob controle, dinheiro em caixa e ganhando títulos. Por quê? Seus presidentes, Rodolpho Landim (Flamengo) e Leila Pereira (Palmeiras) são empresários de sucesso em seus setores de atuação. Não são simplesmente como os antigos políticos do futebol que estavam lá dirigindo o clube. Antes deles, o Bandeira de Mello e o Paulo Nobre já haviam administrado Flamengo e Palmeiras de forma profissional. Por isso, esses dois clubes são exceção.

“Flamengo e Palmeiras não são SAFs, mas dão lucro porque seus presidentes são empresários de sucesso”

De que adiante termos clubes geridos por SAF se a CBF é comandada por dirigentes amadores?
O futebol está se estruturando e, aos poucos, isso não vai mudar do dia para a noite. Somos hoje o investidor da Liga Forte União, que junto com outro bloco, a Libra, está tentando montar uma liga para organizar o Campeonato Brasileiro. A Liga Forte União tem a adesão de mais de 30 clubes. O ideal seria todos os clubes dentro de uma liga, mas já é um avanço. A partir do momento que tivermos uma liga, poderemos profissionalizar a arbitragem do Brasil, por exemplo.

O que chama a atenção nesse movimento de criação da liga são os baixíssimos valores propostos de negociação de direitos de TV, se comparados aos das grandes ligas. O que explica esse descompasso?
Os valores são baixos porque os clubes negociam sozinhos. Esse é um ponto. Os clubes querem antecipação de receita, então acabam negociando direitos futuros para poder ter dinheiro no presente. Outro ponto é que nosso produto também não é dos melhores: o calendário é ruim, incompatível com os de outros países, os gramados são péssimos e nossos melhores jogadores vão para o exterior, entre outros problemas.

Corremos o risco de ver algum outro esporte ocupar o lugar do futebol no Brasil?
O próprio futebol – só que do exterior – invadiu o País, ocupando um espaço que era nosso. Quando era criança, eu usava a camisa do Cruzeiro, meu time de coração. Hoje, os filhos dos meus amigos usam a camisa do Real Madrid, do Manchester City, do Barcelona…

Como reverter isso?
O que falta é profissionalização. O futebol é um esporte que, no Brasil, tem pouca concorrência de outras modalidades. Somos um dos maiores consumidores de futebol do mundo em comparação com qualquer outro país que tem ligas superiores em termos de faturamento. Nossa economia é maior do que a da Espanha, país do maior clube do mundo, o Real Madrid. Temos tudo aqui para fazer bem-feito, é só profissionalizar.

As casas de apostas, as bets, invadiram o futebol, patrocinando clubes brasileiros e do exterior. Isso ocorre em meio a casos de jogadores envolvidos com apostas. Não é preocupante?
É importante e preocupante não só no Brasil como no mundo e não só no futebol, como em outros esportes. Primeiro ponto: não vejo problema de as bets patrocinarem o futebol ou suas marcas estarem nas camisas dos times de futebol – elas geram uma receita importantíssima para os clubes. Além disso, elas não invadiram só o Brasil como a Inglaterra, que é principal campeonato mais organizado do mundo. O problema para mim não é esse, tanto que teve atletas da NBA sendo expulsos do esporte por estarem envolvidos com apostas – e aposta a favor de vitória do próprio time – e lá não tem patrocínio de bets na camisa dos clubes.

Então o problema é a questão da aposta de jogadores, como o caso que está sendo investigado envolvendo o Lucas Paquetá, atleta da Seleção Brasileira?
O que tem de ficar claro é que jogador não pode apostar, nem pode ter familiares ou amigos apostando. Eu vejo menos como um problema das bets e mais como um problema de conscientização dos atletas. Quando alguém cometer um deslize e for comprovado que esse jogador influenciou algo no jogo, não resta dúvidas de que a punição tem de ser exemplar.





Fonte: Neofeed

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Como Christopher Reeve, o Superman, se tornou um super-herói da vida real

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Como Christopher Reeve, o Superman, se tornou um super-herói da vida real
Tempo de Leitura:7 Minuto, 8 Segundo


Comovente, sem ser piegas, o documentário Super/Man — A História de Christopher Reeve, é, acima de tudo, um filme sobre o amor à vida. O relato de como o eterno Superman, galã de Hollywood, atlético, marido e pai amoroso, amigo querido, de uma hora de uma hora, perde tudo.

E, de como, apesar das imensas dificuldades impostas pelo acidente que o deixou tetraplégico, encontra forças para dar um novo significado à sua existência.

De 27 de maio de 1995, quando em uma competição de hipismo, Reeve caiu do cavalo e fraturou as duas primeiras vértebras cervicais, até sua morte, em 10 de outubro de 2004, aos 52 anos, foram quase nove anos e meio, preso à uma cadeira de rodas, sem mexer um músculo do pescoço para baixo e respirando a maior parte do tempo por aparelhos.

Mesmo assim, o ator transformou a tragédia em ação. Virou ativista e lutou até o fim pelos direitos das pessoas com paralisia. “Eu achei que tinha de fazer algo, não só por mim, mas por todos na mesma condição”, diz, no filme.

Obcecado pela cura, Reeve, com sua fundação, financiou procedimentos médicos inovadores. Defendeu mudanças nas normas dos seguros de saúde. Comprou briga, em 2001, com o então presidente George W. Bush, quando o governo americano proibiu as pesquisas com células-tronco embrionários.

Em 2013, graças às iniciativas do ator, foi aprovada a Lei de Assistência Acessível, que garante aos portadores de paralisia acesso a cuidados de alta qualidade, de modo a atender as necessidades individuais dos pacientes e permitir-lhes viver da maneira mais independente possível.

Dirigido por Ian Bonhôte e Peter Ettedgui, o longa foi construído a partir de uma extensa e minuciosa pesquisa sobre a vida de Reeve, antes e depois da tragédia.

O projeto contou com a participação ativa de seus três filhos — Matthew e Alexandra, do primeiro casamento, com a agente de modelos britânica Gae Exton, e o caçula William, da união com a atriz e cantora Dana Morosini, o grande amor da vida do ator, morta em 2006, vítima de um câncer de pulmão, aos 44 anos.

Apresentado de forma não linear, o longa inclui imagens de arquivo e filmes caseiros, inéditos do grande público. Traz ainda entrevistas com atrizes e atores de Hollywood que eram amigos e colegas de Reeve, como Meryl Streep, Susan Sarandon, Glenn Close e Whoopi Goldberg,

Como disseram várias vezes, Bonhôte e Ettedgui não queriam “mais um daqueles documentários bobos que colocam as celebridades em um pedestal”.

A vida de Reeve nunca foi fácil, mesmo com a fama. E Super/Man mostra as dificuldades.

Traz a juventude conturbada pelo divórcio dos pais e a complicada relação com o poeta Franklin Reeve (1928-2013), que cobrava do filho excelência acadêmica, atlética e artística — depois do acidente, os dois se reconciliaram. Revela ainda o casamento conturbado com Gae. E a queixa de Matthew sobre a ausência do ator durante a maior parte da infância do primogênito.

O filme tampouco esconde as crises de profunda tristeza de Reeve e Dana pelas perdas provocadas pela lesão na medula espinhal — conhecida no meio médico como “fratura do enforcado”.

“Você continua sendo você e eu te amo”

Formado pela Cornell University, em 1974, Reeve estudou artes dramáticas na Julliard School, onde conheceu Robin Williams (1951-2014), seu melhor amigo. Depois de alguns papéis na Broadway, no cinema e na televisão, veio 1977, o ano que marcaria a virada em suas pretensões como ator.

Vários artistas, mais famosos do que ele queriam ser o Superman. Mas o diretor Richard Donner (1930-2021) procurava alguém desconhecido. Reev fez o teste e ganhou o papel. Seu pai e alguns colegas condenaram a decisão: achavam aquele personagem menor, infantil.

A equipe do filme ficou impressionada com sua atuação tanto como Superman quanto como alter ego do super-herói, o tímido jornalista Clark Kent.

“Eu entendi que se eu me saísse bem nesse papel, minha vida mudaria”, conta ele, em entrevista da época. “John Hauseman [o lendário ator e produtor, professor na Julliard] me disse: ‘Senhor Reeve, é importante que o senhor seja um ator clássico sério, a menos, claro, que te ofereçam muito dinheiro para fazer outra coisa.”

Nos quase nove anos e meio em que esteve preso a uma cadeira de rodas, Reeve foi um ferrenho ativista dos direitos das pessoas com paralisia (Foto: Divulgação)

Grande amor da vida de Reeve, Dana ficou ao lado do marido até o fim. Morreu dois anos depois dele, aos 44 anos, vítima de um câncer de pulmão (Foto: Divulgação)Dana e Reeve ficaram casado por 17 anos

Os três filhos do ator participaram intensamente do documentário. Na imagem, o caçula William aparece entre os diretores Peter Ettedgui (à esquerda) e Ian Bonhôte (Foto: imdb.com)

A atuação de Reeve tanto como Superman quanto como alter ego do personagem, o tímido jornalista Clark Kent., foi um sucesso de crítica e público. No filme de 1978, ele fazia para romântico com Margot Kidder, intérprete de Lois Lane (Foto: imdb.com)

Ao longo de toda a vida, Reeve tentou se desvicilhar, sem sucesso, do personagem que o tornou famoso (Foto: Divulgação)

Graças ao herói vindo do planeta Kripton, Reeve foi lançado ao estrelato. Viriam mais três filmes, nos nove anos seguintes, os dois últimos massacrados pela crítica. Depois do sucesso,  o ator tentou se livrar do estigma de Superman. Em vão. Ele ficaria ternamente marcado pelo personagem de collant azul e capa vermelha.

Os filhos de Reeve são presenças constantes e importantes no documentário. Eles mostram generosidade e afeto pelo pai, apesar de expor suas falhas junto à família. Os três contam que tudo com o ator era sobre “atividade e ação” — nadar, andar de bicicleta, correr… Reeve sempre muito competitivo.

“Eu arruinei minha vida e a de todo mundo. Não vou poder mais esquiar, velejar, jogar bola com Will [à época do acidente, o caçula tinha apenas três anos]. Não vou mais poder fazer amor com Dana. Talvez seja melhor eu partir”, diz o ator, no documentário.

Mas uma frase da mulher o livrou dos pensamentos suicidas, como ele conta no filme: “Você continua sendo você e eu te amo”.

A consciência da “escuridão”

Reeve encontrou forças na família, nos amigos e na convivência com pacientes como ele. Williams foi fundamental. É ele quem arranca o primeiro riso do ator, ao entrar no quarto de hospital fingindo ser um proctologista russo.

Foi ideia do comediante levar o amigo, a bordo de sua van, à premiação do Oscar, de 1996. Lá, Reeve foi aplaudido de pé. Lá, sua vida sofreria (outra) reviravolta.

O ator percebeu o poder de sua influência e passou a usar a fama para mobilizar autoridades e cientistas na busca por tratamentos que devolvessem os movimentos a pacientes como ele. Com isso, as pessoas começaram a se unir em torno dele, inclusive políticos como o presidente Bill Clinton — essa parte de sua biografia era desconhecida até mesmo pelos fãs.

Em Super/Man, Meryl Streep diz acreditar que, se Reeve estivesse vivo, Williams não teria cometido suicídio, uma década depois da morte do amigo, aos 63 anos. Mas é como Susan Sarandon lembra: os dois tinham consciência da “escuridão”. Um, a tetraplegia, e o outro, a depressão.

Com todas as limitações (e apesar delas), Reeve estreou na direção, com o filme In the Gloaming, de 1997. Sete anos depois, lançou The Brooke Ellison Story, sobre a vida da ativista americana, tetraplégica, ao ser atropelada na adolescência.

Perseverança e resiliência

Em 9 de outubro de 2004, poucas horas depois de acompanhar um jogo de hóquei de Will, o ator entrou em coma. Por causa de uma infecção, sofreu uma parada cardíaca no dia seguinte.

Super/Man é um filme pesado, porém necessário e inspirador. “Ver alguém que luta assim e mantem sua humanidade te dá uma grande esperança”, declara Williams, em um vídeo, recuperado por Bonhôte e Ettedgui.

Depois de voar nas telas como o maior de todos os super-heróis (“mais rápido do que uma bala, um trem e um avião”), Reeve conseguiu driblar as adversidades que lhe foram impostas pela vida e deixar um legado de perseverança e resiliência.

Apesar de seu otimismo e força de vontade, o ator sabia que não viveria para usufruir de suas conquistas como ativista. Daí sua generosidade.

No documentário, ele fala sobre seu principal personagem, muito tempo antes do acidente: “Eu não sou aquele herói. Interpretei um papel. Não sou aquele homem”. Na vida real, sem mexer um músculo, Reeve foi muito mais do que apenas o Superman.



Fonte: Neofeed

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Mira Schendel, a artista que soube “brincar” com as palavras

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Mira Schendel, a artista que soube
Tempo de Leitura:6 Minuto, 39 Segundo


Nos anos 1960, a artista Mira Schendel (1919-1988) ganhou uma quantidade enorme de papel japonês. Reconhecida como um dos nomes mais representativos da arte brasileira do século 20, ela se viu diante do desafio de trabalhar com um material extremamente delicado. Como rasgava com facilidade, Mira não conseguia desenvolver nada com o presente recebido.

Até que ela conheceu a monotipia — técnica de impressão, situada entre a gravura e a pintura ou o desenho, que consiste em criar uma mancha com tinta sobre uma superfície não porosa e então transferi-la para o papel. Imediatamente, Mira se apropriou do método, adaptando-o ao seu modo de trabalhar.

Sobre vidro ou acrílico, ela espalhava uma camada de tinta a óleo, polvilhava talco por cima e, com extrema delicadeza, riscava o papel — às vezes utilizando a própria unha.

Daquele momento em diante, Mira produziu mais de 2 mil monotipias. Agora, cerca duas centenas delas estão expostas na mostra Mira Schendel — esperar que a letra se forme, em cartaz no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, até 2 de fevereiro.

“Nas monotipias, é a plataforma em que o escrever e o desenhar se emaranham infinitamente”, diz o curador Paulo Miyada, em entrevista ao NeoFeed. Ao realizar esse processo, é como se Mira revelasse algo que estava escondido dentro do papel, à espera de um toque para se manifestar.

Como a tinta penetra no papel ficando visível nas duas faces, o crítico de arte Rodrigo Naves, em seu ensaio sobre a artista no livro O Vento e o Moinho, compara as monotipias de Mira a tatuagens: “Essas linhas que parecem tatuadas na pele falam de um corpo generoso que, ao agir no mundo, simultaneamente sente e dá sentido”.

Sobre a superfície branca, Mira “tatuou” linhas, círculos, letras soltas e frases como “este é um desenho gostoso”, de 1965. “Ela elimina qualquer hierarquia ou causalidade entre a escrita e o desenho. Não é um desenho escrito, nem uma escrita desenhada. São as duas coisas, indissociáveis”, afirma Miyada.

Alemão, italiano, francês e português

Myrrha Dagmar Dub nasceu em Zurique, Suíça, em 1919. Mudou-se para Milão, Itália, na década de 1930, onde estudou arte e filosofia, sendo a primeira mulher a se matricular no curso, da Univerita Cattolica del Sacro Cuore. Com a ascensão do nazismo, porém, foi expulsa das aulas, por ser judia.

Em 1949, veio para o Brasil com o passaporte amarelo dos apátridas. Inicialmente, ela se estabeleceu em Porto Alegre. Segundo sua filha, Ada, Mira lia em alemão, contava em italiano, mas falava português nas ruas. Em suas monotipias, é possível encontrar palavras nesses idiomas, além de francês.

Na capital gaúcha, além de realizar pinturas, trabalhou com design gráfico para complementar sua renda. Ao observar as capas de livros criadas por Mira, é possível perceber seu talento para compor imagens com massas de cor e palavras.

“Quando olhamos para esse trabalho gráfico, já podemos ver que ela tem um entendimento compositivo do plano, que lida com a palavra, e que é menos sobre a ilusão de profundidade e mais sobre a justaposição”, observa o curador.

O interesse pelas palavras também está em suas pinturas figurativas da década de 1960, onde a artista insere textos, seja pintando palavras ou colando recortes de jornal.

Em uma dessas obras, ela retrata a mesa de um artista e insere a manchete “REAÇÃO TENTA TOMAR O CNTI”, de 1964. Por meio da colagem, Mira captura o clima de tensão gerado pelo recente golpe militar ocorrido no ano em que fez a pintura. CNTI é a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria.

“Uma arte-escritura”

Em 1951, Mira participou da 1ª Bienal Internacional de São Paulo, o que lhe permitiu contato com experiências internacionais e facilitou sua inserção na cena artística nacional. Dois anos depois, mudou-se para São Paulo aproximando mais dos artistas de vanguarda e adotou o sobrenome Schendel, de seu segundo marido.

Embora seu trabalho tenha pontos de contato com os movimentos de arte concreta, neoconcreta e até com a poesia concreta, Mira nunca se filiou a nenhum grupo.

“É possível vê-la ao lado de vários artistas, mas ela nunca quis entrar em um grupo ou fazer parte de um movimento, pois entendia a importância dessa percepção subjetiva de cada pessoa”, lembra Miyada. “Seria impossível imaginar o que seria a obra de Mira se a poesia concreta não existisse no Brasil. Eles têm muitos temas em comum, cada um em sua própria avenida, mas estão compartilhando as mesmas perguntas.”

Mira Schendel — esperar que a letra se forme fica em cartaz até 2 de fevereiro. Na imagem, detalhe de obra sem título (Foto: Ricardo Miyada)

As obras de Mira refletem seu talento para compor imagens com massas de cor e palavras, como no trabalho “a pergunta”, de 1965 (Foto: Ricardo Miyada)

A obra de 1964, sem título, capta o clima de tensão gerado pelo então recente golpe militar (Foto: Ricardo Miyada)

Nas monotipias, é como se Mira revelasse algo que estava escondido no papel, a exemplo de “este é um desenho gostoso”, de 1965 (Foto: Ricardo Miyada)

“Uma arte-escritura /de cósmica poeira de palavras”, escreveu o poeta concreto Haroldo de Campos, sobre o trabalho de Mira. Na imagem, obra sem título, de 1965 (Foto: Ricardo Miyada)

O crítico de arte Rodrigo Naves compara as monotipias de Mira a tatuagens. Na imagem, trabalho sem título, de 1964-1965 (Foto: Ricardo Miyada)

Nos anos 1930, a artista se mudou para Milão, onde estudou arte e filosofia. Na imagem, colagem e desenho sem título, de 1965 (Foto: Ricardo Miyada)

É difícil não pensar nas frases escritas em seus trabalhos também como poemas. “Uma arte-escritura /de cósmica poeira de palavras/uma semiótica arte de ícones, índices, símbolos que deixa no branco da página seu rastro numinoso/esta é a arte de Mira Schendel”, escreveu o poeta Haroldo de Campos (1929-2003), em texto republicado no catálogo da mostra.

As nuvens de letras e palavras ganham corpo e tridimensionalidade no final dos anos 1960, quando Mira começa a produzir os Objetos Gráficos. Ela insere suas monotipias entre duas placas de acrílico, criando um objeto tridimensional em que o espectador não consegue distinguir o que é frente ou verso.

Em um texto publicado no material de apresentação de Mira Schendel — esperar que a letra se forme, a artista elenca as vantagens da descoberta do suporte para expor o trabalho:

“Torna visível a outra face do plano, negando que o plano seja apenas plano; possibilita uma leitura circular, na qual o texto é um centro imóvel e o leitor, um móvel; e a transparência que caracteriza o acrílico é uma falsa transparência do sentido explicado. Não é a transparência clara e monótona do vidro, mas a transparência misteriosa da explicação, que suscita questões”.

“O silêncio visual”

Esses trabalhos geralmente são expostos pendurados por fios de nylon, dando a sensação de estarem suspensos no ar — ajudando o visitante a compreender o estado gasoso que o trabalho de Mira evoca, um mundo onde não parece haver gravidade.

A exposição se encerra com a instalação Ondas paradas de probabilidade, apresentada em 1969, na 10ª Bienal Internacional de São Paulo. Esta edição da Bienal ficou conhecida como a “Bienal do Boicote”, devido ao protesto de artistas nacionais e internacionais que se recusaram a enviar obras, por causa da ditadura.

Como a exposição era organizada pelo físico e crítico de arte Mário Schenberg (1914-1990), amigo de Mira, ela topou participar. Contudo, criou uma obra quase invisível.

Suspendeu fios de nylon que pendiam do teto ao chão, distribuídos em grades quadriculadas. Sobre o trabalho, em um texto exposto ao lado da obra, a artista escreve: “a visibilidade do invisível”, “o silêncio visual”.

Essa era sua forma de protesto: estar presente de forma quase invisível, silenciosa.

Hoje, na era das mídias sociais, com seu excesso de conteúdo e palavras, a exposição termina com uma ode ao silêncio, em um espaço onde a artista Mira tem tanta voz — ainda que em texto.





Fonte: Neofeed

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“Guerra da geração distribuída” chega ao Congresso e expõe distorções dos subsídios no setor elétrico

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“Guerra da geração distribuída” chega ao Congresso e expõe distorções dos subsídios no setor elétrico
Tempo de Leitura:7 Minuto, 0 Segundo


A disputa pelo bilionário mercado de geração distribuída (GD) envolvendo as comercializadoras e as distribuidoras de energia, avaliado em R$ 140 bilhões, ganhou escala com uma série de denúncias contra as distribuidoras, acusadas de concorrência desleal e alvo de um projeto de lei em discussão no Congresso Nacional.

O Projeto de Lei 671/2024, apoiado pelas empresas de energia solar, passou por uma audiência conturbada esta semana na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados e pode ir à votação em até duas semanas.

Proibidas por lei de desempenhar atividade de geração ou de comercializar energia via GD – atuações estranhas ao seu objeto de concessão, limitado à distribuição de energia -, as distribuidoras estão sendo acusadas de barrar pedidos de conexão à rede feitos por outras comercializadoras, alegando que o sistema está sobrecarregado.

Na audiência na Câmara, surgiu outra acusação, ainda mais grave, que vai além de uma possível má vontade das distribuidoras – elas estariam usando outras unidades de seu grupo, com outro CNPJ, não só para comercializar energia como para aproveitar os pedidos das outras comercializadoras para oferecer conexão a empresas que tiveram seu pedido barrado.

O PL, com relatoria do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), tem como objetivo justamente vedar a atividade de micro e minigeração distribuída de energia (MMGD) por distribuidoras ou empresas de um grupo econômico que atua na distribuição.

Por trás da disputa, vem à tona um problema que permeia o setor elétrico nacional: o crescimento desordenado da GD, de 35% apenas este ano, impulsionado por subsídios generosos para as fontes renováveis, em especial para a energia solar.

Esse crescimento está distorcendo o mercado de energia e levando ao limite a capacidade do sistema de atender a demanda do consumidor comum, que recebe energia das distribuidoras.

O fato é que a GD ajudou a transformar a energia solar num grande negócio, por permitir a geração de energia elétrica no local ou próximo ao ponto de consumo e colocar o excedente no sistema.

Concentrada nos painéis fotovoltaicos que captam energia nos telhados, o segmento de geração distribuída deve fechar o ano com cerca de 35 gigawatts (GW) em capacidade instalada, o equivalente a mais de duas usinas de Itaipu.

Novo nicho

A atual crise é resultado de um desdobramento do boom da energia solar – o surgimento de um modelo de negócio mais sofisticado e lucrativo do que a instalação de painéis fotovoltaicos nos telhados das residências, que já garantia subsídios na conta de luz até 2045.

Avaliado em R$ 40 bilhões, atrai empresas que investem numa fazenda solar, com vários painéis fotovoltaicos (com capacidade máxima de 5 MW, suficiente para atender 3 mil residências). A fazenda solar produz energia e vende via aplicativo para um consumidor, que “aluga” um pedaço dessa usina com desconto de 15%, em média, na conta de luz.

A nova modalidade, que não exige que o cliente tenha painel solar, também é beneficiada pelos subsídios das fontes renováveis e não paga nada à distribuidora para transmitir a energia. O público-alvo das fazendas solares são empresas que consomem muita energia, como comércio de pequeno e médio porte, mas não suficiente para migrar para o mercado livre.

Na prática, as fazendas solares oferecem preço mais baixo na conta de luz do que o cobrado pelas distribuidoras e, além de “roubar” seus clientes com maior tíquete, indiretamente exigem mais investimento da concessionária para aumentar a capacidade de transmissão do sistema. Apesar da distorção, a atuação das fazendas solares é assegurada pela Lei 14.300, de 2022.

A taxa de retorno das fazendas solares, calculado em 35% ao ano pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), explica o crescimento desse nicho e também a reação das distribuidoras, que entraram no negócio por meio de outras empresas do grupo.

A audiência na Câmara colocou lado a lado as partes envolvidas na disputa. Representantes de entidades que atuam no segmento de GD, como Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), INEL (Instituto Nacional de Energia Limpa) e a FMGD (Frente Mineira de Geração Distribuída), fizeram acusações graves, contestadas pela Abradee.

Boa parte das denúncias de irregularidades está concentrada em Minas Gerais, estado que atrai instalações de fazendas solares pelo preço baixo do terreno e incentivos fiscais oferecidos pelo governo estadual.

A grande demanda de instalações levou a Cemig, concessionária local, a alegar sobrecarga do sistema para barrar cerca de 80% dos pedidos de conexão à rede, de acordo com as comercializadoras. Mas Wedson dos Reis Alves da Silva, presidente-executivo da FMGD, citou o caso da Universidade de Viçosa como exemplo de suposta atuação desleal da Cemig.

“O integrador tinha procurado a universidade para fazer a instalação, propôs o projeto, assinou o contrato com essa universidade e, um tempo depois, teve resposta da Cemig Distribuição falando que era impossível, cobrando R$ 4 milhões para fazer a melhoria de rede para fazer a inserção nesse sistema. Dois meses depois, um sistema já estava sendo instalado pela própria Cemig”, contou na audiência.

Procurada, a Cemig negou em nota praticar a irregularidade, esclarecendo que “trata com total isonomia todas as empresas de geração distribuída (GD), sem qualquer distinção, atuando de acordo com a regulação existente, de forma técnica e responsável”.

“Boi de piranha”

Levantamento da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) indica que, no primeiro semestre, foram recusados pedidos de conexão à rede em Minas Gerais com investimentos que somam R$ 10 bilhões.

Bárbara Rubim, vice-presidente de geração distribuída da Absolar, diz que o argumento das distribuidoras de que as fazendas solares sobrecarregam o sistema não se sustenta. “Do total de produção fotovoltaica do País, 75% são de painéis instalados em telhado, as fazendas solares viraram boi de piranha para as distribuidoras recusarem pedidos de conexão.”

Outro representante do setor, Carlos Evangelista, presidente da ABDG, aponta dois problemas em relação à recusa das distribuidoras em fazer a conexão. Um deles é um problema técnico chamado inversão de fluxo de potência – que ocorre quando um sistema solar instalado em uma unidade consumidora gera mais energia do que esta consome.

“Esse problema ocorre em determinados horários e só a distribuidora dispõe dessa informação”, diz Evangelista. “Além disso, é comum as distribuidoras não cumprirem o prazo para analisar o pedido de conexão, jogando fora milhões de reais de investimento de uma empresa para montar uma fazenda solar; mesmo indo à Justiça, a resolução demora.”

Em entrevista ao NeoFeed, Marcos Madureira, presidente-executivo da Abradee, que representa as distribuidoras, rebateu as acusações do segmento solar e enfatizou que o PL apresentado na Câmara não tem base legal.

“O PL é contrário à Lei de Liberdade Econômica que assegura o direito à iniciativa privada”, diz Madureira. “As distribuidoras não fazem investimentos em geração distribuída, são impedidas por serem concessionárias, o que existe são grupos econômicos que atuam em transmissão, geração, distribuição e comercialização há algum tempo, e que também têm empresa de geração distribuída no seu portfólio.”

Em relação à Cemig, o presidente da Abradee afirma que a fiscalização efetuada pela Aneel não encontrou indícios de irregularidades. “Há, sim, um grande número de pedidos de conexão à rede em todo o País, numa média de 60 mil solicitações mensais”, afirma Madureira.

Em uma mostra de dinamismo das distribuidoras, segundo ele, o volume de conexões efetuadas foi de 70% em relação ao total solicitado, “o que desmente a ideia de que estaríamos barrando a maioria dos pedidos”.

Madureira admite, porém, a saturação em alguns locais do número de pedidos de conexão à GD, citando inversão de fluxo de potência em alguns horários. “É um problema técnico que já passou da GD e começa a afetar o sistema interligado nacional como um todo”, diz.

Para o presidente da Abradee, os subsídios continuam sendo o pano de fundo dessa crise que atinge a geração distribuída. “O que vemos é o Congresso Nacional com vários projetos de lei propondo ampliar os prazos para o uso de subsídios, o que só agrava a distorção na GD”, afirma Madureira.

Ele também propõe uma discussão de endereçar o problema técnico que atinge a geração distribuída, como o uso de baterias para armazenar a energia excedente e jogá-la no sistema quando a demanda for maior, tendo em vista o preço adequado.

“Por isso, as distribuidoras veem o projeto de lei como uma forma de puni-las pelas dificuldades que estão sendo provocadas pelo próprio segmento de geração distribuída”, diz Madureira.

 





Fonte: Neofeed

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