Negócios
Muito além das compras: a estratégia dos shopping centers para crescer em tempos incertos
Os shopping centers, do modo como os conhecíamos, não existem mais. A ideia de centros comerciais apenas como lugares onde os varejistas vendem seus produtos está cada vez mais ultrapassada. De “meca das compras”, esses empreendimentos vêm se convertendo em “meca de experiências” — um mix de varejo, serviços, entretenimento e lazer.
A diversificação permite ao setor navegar o mar das incertezas econômicas com certa tranquilidade. Enquanto o varejo sofre com a aceleração das taxas de juros, os shoppings fecharam o terceiro trimestre de 2024 com uma ocupação de 94,7%, índice considerado saudável pela Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce).
Fácil entender o porquê. Cerca de seis em cada dez brasileiros não vão ao shopping para fazer compras, mas sim para cuidar da beleza, se exercitar, assistir a um filme ou a uma peça teatral, levar as crianças (e os pets) para passear, fazer uma boa refeição, passar por uma consulta médica, tirar documentos… e até estudar.
Hoje, 84,9% dos shoppings no país contam com salões de cabeleireiro, 63,6% têm academias de ginástica; 49%, supermercados; e 32%, faculdades. Negócios que se tornaram estratégicos não só para manter, como também para aumentar a recorrência das visitas.
“Neste último trimestre, o fluxo de consumidores acompanhou as vendas, com um crescimento de 2,3% em ambos, evidenciando a capacidade dos shoppings em engajar o público”, comemora Glauco Humai, presidente da Abrace.
Mantido o ritmo registrado até agora, 2025 promete ser igualmente auspicioso. No ano passado, os 639 centros comerciais espalhados pelo Brasil faturaram R$ 194,7 bilhões — 5,2% a mais do que em 2022.
A tendência de fazer dos shoppings o espaço para onde converge boa parte das atividades da vida contemporânea é global e vem ganhando força nos últimos anos.
Da pandemia do novo coronavírus à urbanização crescente, do aumento da criminalidade nas grandes cidades à ascensão das novas gerações ao mercado consumidor, as explicações para o fenômeno são tão extensas quanto diversas.
Rede de shoppings, não
Tanto que a Allos, cujo portifólio conta com 58 centros comerciais em 40 cidades brasileiras, fez um reposicionamento de marca e, hoje, não se define mais como uma rede de shoppings, mas como uma plataforma de varejo, entretenimento e serviços, diz Daniela Guanabara, diretora de estratégia e relações com investidores da companhia, em conversa com o NeoFeed.
A gastronomia é um dos focos da companhia. Em cinco anos, os serviços de alimentação em suas unidades cresceram 48%. Mas esqueça as refeições feitas em bandejas e talheres de plástico — não é disso que se trata.
“O modelo casual dininig, no qual a pessoa pode sentar num ambiente mais confortável, pedir prato a um garçom e desfrutar de uma refeição mais lenta, vem ganhando cada vez mais espaço no mix”, explica Daniela.
Parte do estacionamento do Shopping Tijuca, no Rio de Janeiro, por exemplo, será transformado em um hub com 29 restaurantes e bares, batizado de Taste Lab, um modelo já em funcionamento do Norte Shopping, também na capital fluminense.
E a expansão do Shopping Campo Grande com 150 novas operações irá incluir uma área com restaurantes inéditos na cidade sul-matrogrossense.
O poder de uma vista
Administrado pela empresa Ancar, o Botafogo Praia Shopping, na Zona Sul carioca, fez do terraço onde estavam instalados os aparelhos de ar-condicionado um restaurante de 600 metros quadrados, com vista para a Baía de Guanabara.
O espaço atrai não só clientes do shopping para o estabelecimento, como também cariocas e turistas que vão até lá apenas pela paisagem — altamente “instagramável”, diga-se.
Cecília Ligiéro, head de marketing e inovação da Ancar, conta ao NeoFeed que, dos 24 shoppings, 14 têm “varandas” semelhantes — ou seja, espaços ao ar livre, com parques infantis e para pets, além de restaurantes e bares.
No primeiro trimestre de 2025, outras duas serão inauguradas, sendo uma no Shopping Porto Velho, em Rondônia, e a outra no Shopping Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Em ambos os casos, um trecho do estacionamento está sendo convertido para abrigar as novidades gastronômicas.
Até aqui, a experiência tem mostrado que quanto maior e mais eclético o leque de opções oferecidos pelos shoppings, melhor para os negócios.
Em 2020, o espaço ocupado pela marca de moda Forever 21, no Bossa Nova Mall, nas proximidades do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, deu lugar a uma sala VIP e a um posto de emissão de vistos americanos.
O ganho com o aluguel a partir da remodelagem foi de 80%, conta ao NeoFeed Carlos Frederico Youssef, CEO da Alqia, pertencente à gestora de alternativos HSI, responsável pela administração de uma dezena de shoppings.
Desde o fim do isolamento social imposto pela covid-19, as prioridades da companhia estão voltadas para o entretenimento, o lazer e a gastronomia. O próximo passo é a formação de um pool de restaurantes nos shoppings do grupo, além das praças de alimentação.
“Percebemos que, à medida que a gente vai incrementando o número de operações, ninguém rouba a fatia de ninguém. Todos crescem juntos”, afirma Youssef. Ou, como lembra ao NeoFeed Armando d’Almeida Neto, diretor vice-presidente financeiro e de relações com investidores da Multiplan, “um restaurante pode ser um sucesso, mas seis reunidos são imbatíveis”.
Até setembro, a empresa, dona de 20 shoppings no país, havia investido R$ 309,7 milhões em sete expansões, totalizando 67 mil metros quadrados. No DiamondMall, em Belo Horizonte, um piso de estacionamento virou uma nova área de varejo, com 25 novas lojas de moda e gastronomia.
Enquanto isso, no Parque Shopping Barigui, em Curitiba, um terceiro andar foi construído para abrigar um centro médico e 75 novas operações. Estão em andamento, ainda, reformas de ampliação no Morumbi Shopping, em São Paulo, e no Parque Shopping Maceió, na capital alagoana.
Compra por impulso
Para Alexandre Machado, sócio da Hedge e gestor dos fundos focados em shoppings, um centro comercial que ofereça serviços já integrados à rotina das pessoas, como academias de ginástica, escolas e pet shops, tende a ficar na lembrança das pessoas como primeira opção no momento de consumo.
O artigo Varejo e Shopping Centers: como a indústria do consumo pode se reinventar, da revista MIT Technology Review, é peremptório: “Os espaços de sucesso do futuro são lugares que as pessoas desejam visitar. Eles dão às pessoas uma razão para estarem lá — e se estão gastando seu tempo em algum lugar, geralmente estão gastando dinheiro também”.
E, como bem lembra Luiz Alberto Marinho, sócio-diretor da consultoria Gouvea Malls, em entrevista ao NeoFeed, ao manter os consumidores circulando por seus corredores, os shoppings podem acabar estimulando as compras por impulso.
Negócios
Gerdau investe R$ 3 bi em energia limpa, aumenta fatia em comercializadora e prepara mais M&As
Quinta maior empresa consumidora de energia do Brasil, a gigante do aço Gerdau quer ser também uma companhia gigante na produção de energia sustentável. Para isso, encontrou dois caminhos: o primeiro deles é comprar ativos para ser dona da própria produção de energia. O segundo é ser, de forma indireta, também comercializadora e vender ao mercado a energia produzida a partir de fonte solar.
Nos últimos 12 meses, a empresa investiu mais de R$ 3 bilhões na construção de dois parques solares e na aquisição de PCHs (pequenas centrais hidrelétricas). E, em 2025, já decidiu que vai comprar outras hidrelétricas e avançar em parques eólicos. Com as iniciativas, a Gerdau já conta com 52% de sua energia oriunda de fonte renovável e certificada. O objetivo é chegar a 80% até 2031.
“O investimento em ativos de energia renovável está alinhado à estratégia da Gerdau de gerar maior competitividade no custo dos seus negócios, aumentando a autoprodução de energia limpa, e em linha com o processo de descarbonização já divulgado pela companhia”, diz o CEO da Gerdau, Gustavo Werneck.
No início deste ano, a empresa inaugurou o parque solar Arinos, em Minas Gerais, que foi anunciado em 2023 e que resultou em investimentos de R$ 1,5 bilhão. A produção pode chegar a 420 megawatt-pico (MWp). A capacidade fotovoltaica equivale a 7% do consumo de energia anual da Gerdau, que consome 6 mil MW por ano. Do volume produzido no parque solar, 30% irá abastecer diretamente as fábricas da Gerdau.
Em 21 de janeiro, a companhia comprou da Atiaia Energia as empresas Rio do Sangue e Paranatinga Energia, donas de duas PCHs no Mato Grosso, por R$ 440 milhões. As hidrelétricas fornecerão energia renovável para as unidades produtivas da Gerdau, no regime de autoprodução, em um montante equivalente a 8% do consumo de energia das operações da empresa no Brasil. As duas possuem capacidade instalada de 29 megawatts (MW) cada uma.
“Elas fazem parte da estratégia da Gerdau de buscar ser cada mais vez mais produtor de energia limpa. Por isso, essa aquisição das duas hidrelétricas passa a ser muito significativa, que vai nos ajudar a ser mais competitivo no processo produtivo de aço”, diz Flávia Souza, diretora global de energia e suprimentos da Gerdau.
Se, estrategicamente, buscar soluções com menos pegada de carbono são benéficas para a própria imagem do negócio, fato é que a energia limpa de autoprodução custa menos. É uma decisão que mexe no bolso. “Quando falo que ela é competitiva, quero dizer também que ela é mais barata. A energia limpa produzida por nós custa 30% menos”, diz Souza. “Nosso processo é muito intensivo em energia.”
Em 2025, a Gerdau irá realizar mais M&As de empresas que produzem energia limpa. “Temos interesse de continuar prospectando a compra de ativos de energia. Continuamos olhando o mercado e pode ser que a gente faça mais aquisições para complementar nosso portfólio e alcançar nossa meta até 2031”, afirma Souza.
A executiva entende que, com os novos parques solares, agora é necessário diversificar um pouco mais a origem dessa energia limpa. “Nossa matriz solar está bem cheia. Então, queremos sim fazer uma diversificação de fonte. E não adianta comprar de empresas que já tenham esse ativo contratado. Queremos essa energia para Gerdau.” Por isso que, no horizonte, estão mais hidrelétricas e as produtoras de energia por meio de vento.
Com as entregas dos novos parques solares, a matriz de energia a partir da luz do Sol irá corresponder a 60% do total da energia renovável consumida pela empresa. A fonte hidrelétrica representa 16%. “O momento agora é de discussão sobre a alocação de investimentos da Gerdau. E energia está dentro disso.”
Aumento de participação na comercializadora
A empresa também anunciou recentemente a ampliação da participação acionária da Gerdau Next (braço de novos negócios da companhia, criado em 2020) na Newave Energia, empresa focada em energia renovável. Hoje, a subsidiária da companhia de aço é dona de 40% da empresa. Antes, esse índice era de 33,33%. A Newave Energia é uma joint-venture criada pela Gerdau e Newave Capital.
Na prática, isso vai representar maior participação no projeto de construção do parque solar Barro Alto, em Goiás, em um investimento de US$ 1,3 bilhão. A usina deverá entrar em operação no início do ano que vem e terá capacidade de produção de 452 MWp, ainda maior do que a unidade mineira.
O volume de energia gerado pelo parque goiano teria condições de suprir o consumo de uma cidade com 365 mil habitantes (o tamanho de Blumenau, por exemplo). Serão 731 mil painéis solares distribuídos em uma área de 800 hectares.
“O plano está traçado e faz parte de uma estratégia de longo prazo. Em 2022, a gente iniciou a parceria da Gerdau Next para trazer energia renovável e competitiva, como uma linha de negócios. Em outra ponta, direto pela Gerdau, as ações têm sido no sentido de ser uma autoprodutora de energia, para o próprio consumo”, diz Flávia, que também integra o Conselho da Newave.
Nesse sentido, a executiva reconhece o interesse da subsidiária da Gerdau em comercializar energia para o mercado, o que pode incluir até suas concorrentes. “A Gerdau Next, sim, tem interesse, via sua participação na Newave, em fazer a comercialização de energia”, afirma.
Com a nova configuração acionária, a Gerdau terá direito a 40% de toda a energia solar produzida no parque de Goiás. E também terá sua participação na receita dos 60% restantes, que serão comercializados. “O objetivo principal é ter uma energia competitiva e limpa. E, como consequência, a empresa é dona de um negócio que vende essa energia. Com isso, aumentamos nossa receita e nosso retorno.”
Ela diz, no entanto, que não há intenção de, com a Newave, a Gerdau ser uma grande concorrente de empresas como Enel, Engie ou Eletrobras. “Mas é fato que temos uma empresa que tem um plano de negócios, e um portfólio para oferecer ao mercado.”
Negócios
Nas empresas familiares, os herdeiros estão indo para o conselho antes de assumir a gestão
O que Magalu, Votorantim, Gerdau, JBS, Safra, Marfrig e Weg têm em comum? Além de serem companhias brasileiras extremamente robustas em seus segmentos, elas possuem o DNA familiar na formação de suas histórias. Ainda que com executivos de mercados em posições estratégias, a maior parte delas é dirigida por integrantes de familiares ligados aos fundadores.
Mas qual é o segredo para que essas empresas, geridas por familiares, tenham sucesso? E, mais do que isso: como garantir a perenidade dos negócios? Esses talvez sejam os principais desafios das empresas familiares brasileiras.
Fato é que, ainda que com esses grandes cases de sucessos, os números trabalham contra essa realidade. Levantamento realizado pelo Banco Mundial mostrou que apenas 30% das empresas familiares chegam à terceira geração. E apenas 15% sobrevivem a essa sucessão. E o principal motivo é a falta de planejamento sucessório.
Segundo a 11ª Pesquisa Global sobre Empresas Familiares da PwC, somente 24% das companhias familiares se preparam para a sucessão. O resultado são conflitos entre os integrantes da família. E, por consequência, da empesa. O problema é que, sem a clareza de uma liderança, a empresa acaba vendida ou até mesmo indo à falência.
“O grande desafio das empresas familiares é separar as três caixinhas de cada um como família, como sócio e como funcionário. Nem todo mundo tem perfil para ser funcionário, muito menos executivo. Mas todos devem saber cobrar os executivos por resultados como sócios. E isso não pode afetar a relação familiar entre eles”, diz Gilson Faust, sócio da consultoria GoNext, que atuou em mais de 200 sucessões familiares.
Uma ideia está começando a ganhar corpo no mundo corporativo: o conselho de herdeiros. Na prática, são como conselhos de administração, mas que reúnem herdeiros de todas as idades. O objetivo é ensinar sobre o papel de sócios, discutindo questões da empresa e entendendo se possuem o perfil para serem executivos ou não.
No conselho, os herdeiros têm como principal objetivo aprenderem sobre a empresa e seus valores, o mercado que está inserida e seus desafios e oportunidades, além de começarem a acompanhar os resultados da empresa para aprendem a sua futura função de sócios e seus deveres e responsabilidades.
Isso já acontece na rede de supermercados Jacomar, uma das maiores redes de supermercados de Curitiba, fundada em 1966, que já passou de forma organizada para a segunda geração composta por oito irmãos, e que tem 20 pessoas da terceira geração que compõe o conselho de herdeiros.
Priscila Fantin, 27 anos, economista e especialista em gestão empresarial, é uma delas. Primeiro trabalhou no mercado e depois foi para a empresa da família, onde está há sete anos como analista de controladoria. O seu pai é o atual CEO da empresa, mas isso não muda a trajetória que ela precisa seguir na empresa. Ela veio para a área porque havia a vaga e ela tinha a experiencia.
“Nós já não tivemos o contato com os fundadores como a segunda geração, então muito do que fazemos é ver quais são os valores da empresa e como modernizar isso para os novos tempos. E levamos essa ideia para os sócios atuais”, afirma Fantin.
As reuniões do conselho são mensais e híbridas, para contemplar tanto os herdeiros que trabalham na empresa como os que não e estão em outra cidade ou país. Os herdeiros mais atuantes também passam a partilhar das reuniões do Conselho de Administração da empresa como ouvintes para ficarem por dentro das questões atuais, e também absorverem conhecimento para o momento em que passarem a atuar de forma definitiva na empresa.
A família Nichele, dona da Nichele Materiais de Construção, em Curitiba, descobriu as dificuldades de uma sucessão não planejada na prática. O fundador da empresa preparou o filho, Cristiano, para assumir o comando da empresa. Mas, na última hora, resolver compartilhar a gestão com suas outras duas filhas.
A consultoria GoNext foi acionada para ajudar e foi entender qual seria o melhor papel de cada um na empresa. Cristiano se tornou CEO com a aprovação de todos os sócios. As irmãs assumiram as diretorias financeiras e comercial. Já no marketing, ninguém da família tinha vocação e foi contratado um profissional de mercado.
“Meu pai sempre me preparou para assumir, mas depois não sabia muito bem o que fazer com as minhas irmãs e tentou colocar nós três na liderança”, diz Cristian. “Foi muito bom passar todo esse processo mais científico porque assim a aceitação da família foi muito melhor, sem deixar brechas que um ou outro estava sendo beneficiado”.
A terceira geração da família Nichele já começou a ser preparada desde cedo e passou a integrar o conselho de herdeiros com a orientação da consultoria. Já são nove pessoas de um grupo heterogêneo com crianças, adolescente e adultos. Todos os maiores de 14 anos já podem participar das reuniões.
Para Helena Rocha, sócia da PwC Brasil, apesar da transferência do controle para a próxima geração ser um evento extremamente importante e único na vida da empresa familiar, na prática é algo sobre o qual raramente se fala. E isso gera problemas, principalmente quando a sucessão precisa ser antecipada de forma inesperada.
“Ausência de comunicação, de alinhamento e planejamento estratégico comprometem qualquer negócio, mas principalmente as empresas familiares, onde as emoções se misturam entre família e negócio. É imprescindível a comunicação entre as gerações e um contrato geracional honesto”, afirma Rocha.
A organização e sucesso das empresas familiares beneficia a economia. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 90% das empresas brasileiras são familiares e empregam 75% dos brasileiros. Elas são responsáveis por mais de 60% do Produto Interno Bruto (PIB).
Negócios
Os “quadros de lã” de uma brasileira autodidata ganham exposição nos EUA
É uma irônica coincidência que algumas semanas após o governo Trump começar a prender e deportar imigrantes, o American Folk Art Museum, em Nova York, dê voz para uma brasileira que viveu à margem do sistema de produção da arte. Madalena Santos Reinbolt nasceu em Vitória da Conquista, na Bahia, em 1912, trabalhou a maior parte da vida como empregada doméstica e hoje suas obras valem mais de US$ 100 mil.
Esta será a sua primeira exposição individual no exterior e a visibilidade que tem ganhado seu trabalho fez com que o preço de suas obras dobrasse nos últimos dois anos. “Madalena Santos Reinbolt: Uma cabeça cheia de planetas” é o título da exposição com 42 obras têxteis que vai de 12 de fevereiro a 25 de maio. A artista autodidata, mais conhecida por seus bordados em grande escala, feitos com centenas de fios coloridos e vibrantes, e chamados “quadros de lã”, teve reconhecimento tardio.
Durante toda a vida, ela serviu em casas da elite brasileira e uma das fazendas onde trabalhou como cozinheira foi a Samambaia, em Petrópolis, no Rio de Janeiro, onde viviam a arquiteta Lota Macedo Soares e sua mulher, a escritora norte-americana Elisabeth Bishop. Madalena morreu em Petrópolis, em 1976.
Novas datas de nascimento e morte são apresentadas pela primeira vez nessa exposição novaiorquina em consequência das pesquisas feitas por um dos curadores, Blau Edelstein, que ficou vários meses no Brasil apurando detalhes da vida da artista.
“Achei o cemitério onde ela teria sido enterrada e esta exposição está oferecendo novas datas, diferentes das que você encontrará se pesquisar online, porque como empregada doméstica ela meio que escapa dos arquivos”, diz Edelstein, ao NeoFeed.
Blau é americano, mas começou a estudar português na faculdade, veio para o Brasil várias vezes e acabou criando uma relação com o País. Atualmente, ele prepara uma tese de doutorado na Universidade de Princeton, em Nova Jersey, no departamento de espanhol e português.
O tema central é a circulação de obras produzidas em hospitais psiquiátricos brasileiros, algo pensado a partir do projeto de Nise da Silveira, psiquiatra brasileira que se tornou conhecida por revolucionar o tratamento destinado a doentes mentais internados no país.
A exposição do American Folk Art Museum é uma parceria com o Museu de Arte de São Paulo (Masp), que realizou com o mesmo título a primeira individual da artista em 2022. “Estamos atualizando a exposição de alguma forma, com novas pesquisas e contextualizando para o público norte americano, que não só desconhece a obra dela como desconhece muito a arte brasileira”.
Atualmente, com todo o movimento decolonial da arte, várias nomenclaturas passaram a ser rejeitadas. Uma delas é arte “naif” ou “ingênua” ou “primitiva”, categorias nas quais a obra de Madalena foi enquadrada. “Rejeito essas palavras”, diz Edelstein. “Um dos motivos que me levou a fazer a pesquisa foi ajudar a criar uma imagem dela como pessoa, que ia além dessas categorias.”
O valor do bordado
O curador conta que Madalena era descrita como uma grande primitiva, em cartas de Elizabeth Bishop, nas quais a escritora dizia que seria possível ganhar uma fortuna vendendo obras dela na Quinta Avenida, em Nova York. Nessas cartas, escritas por volta de 1952, e posteriormente publicadas, ela dizia que “Madalena era uma grande artista, mas que ela, Bishop, tinha que optar entre a paz e tranquilidade na casa ou a arte. Ela optou pela tranquilidade e Madalena saiu de lá”.
Trabalhou em outras casas de veraneio, sempre como doméstica e cozinheira. O trabalho artístico era feito nas horas vagas. Madalena começou com pinturas, teve uma alergia à tinta e a partir de meados da década de 1960 passa a produzir bordados. “Ela tinha consciência do valor do bordado”, diz o curador. “Embora demorasse muito mais tempo para fazer um quadro bordado ganhava mais dinheiro com ele”.
Anos mais tarde, foi a crítica de arte, curadora, museóloga e antropóloga Lélia Coelho Frota, que descobriu Madalena e foi duas vezes a Petrópolis para entrevistá-la. A artista já tinha morrido quando, em 1978, Lélia foi curadora da seleção dos artistas brasileiros na Bienal Internacional de Veneza e incluiu Madalena.
A presidente Curatorial do American Folk Art Museum, Valerie Rousseau, ao comentar a obra da artista, afirma que só agora, quase 50 anos após sua morte, as realizações artísticas de Madalena começam a receber a atenção crítica que merecem. “O trabalho dela apresenta espaços de liberdade criativa tanto quanto expressões de resistência, ecoando sua própria existência”.
Num dos poucos depoimentos que há da artista, ela diz: “Resolvo tudo na cabeça. Posso ver tudo, mesmo com os olhos fechados… Na verdade, são as agulhas que fazem o desenho”.
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